TJBA 01/02/2022 - Pág. 2011 - CADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.030 - Disponibilização: terça-feira, 1º de fevereiro de 2022
Cad 4/ Página 2011
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ
________________________________________
Processo: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL n. 8000231-23.2019.8.05.0255
Órgão Julgador: V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE TAPEROÁ
AUTOR: NAILTON JOSE DOS SANTOS
Advogado(s): MICHEL SOARES SAO PAULO (OAB:BA33817)
REU: BANCO PAN S.A
Advogado(s): CARLOS EDUARDO CAVALCANTE RAMOS (OAB:BA37489)
SENTENÇA
Trata-se de ação de indenização por danos morais e materiais proposta por NAILTON JOSE DOS SANTOS em face da BANCO PAN
S.A pelo rito da Lei nº 9.099/95. Em sua petição inicial, narrou a demandante, em apertadíssima síntese, que a ré vem promovendo
descontos em seu benefício previdenciário por um empréstimo que não foi contratado por si.
A Instituição Financeira ré apresentou contestação ao Id 43673009 suscitando preliminar de incompetência dos juizados em razão da
necessidade de produção de prova pericial, bem como preliminar de falta de interesse processual pela possibilidade de solução administrativa da controvérsia e, no mérito, defendeu a legalidade do ajuste, juntando aos autos os documentos da contratação e aduzindo
não estarem comprovados os pressupostos da responsabilidade civil.
Audiência de instrução realizada ao Id 43787947. Sem acordo, as partes pediram o julgamento do feito.
É o que importa relatar, passo a decidir.
Inicialmente, rejeito a preliminar de incompetência dos Juizados Especiais por complexidade da causa porquanto a matéria discutida
nos autos não demanda a realização de prova técnica, dado que a falsidade documental na hipótese é tão grosseira que a realização
de prova pericial se torna, de todo, despicienda. Com efeito, a redação do art. 370, parágrafo único, do CPC, é clara no sentido de que o
juiz indeferirá as provas inúteis ou protelatórias. Sendo possível a constatação ictu oculi da falsificação, desnecessária a prova técnica.
Pelo mesmo motivo, rejeito ainda a preliminar de carência da ação, dado que a realização de pedido administrativo não condiciona a
propositura de ações judiciais salvo pouquíssimas hipóteses, conforme remansosa jurisprudência dos Tribunais Superiores.
Como relatado, discute-se nestes a responsabilidade civil da ré por descontos realizados por esta no benefício previdenciário do autor.
As partes não controvertem os descontos, tão somente a contratação e a responsabilidade desta decorrente. Compulsando o caderno
processual, tenho que o caso é de procedência da pretensão autoral. Explico:
De logo, é importante anotar que se está efetivamente diante de uma relação de consumo, dado que autor e réus amoldam-se perfeitamente aos conceitos de consumidor e fornecedor estampados nos arts. 2º e 3º do Código de Defesa do Consumidor, o que atrai a
aplicação daquele diploma.
Como se sabe, o CDC, rompendo com a clássica divisão civilista da responsabilidade civil em contratual e aquiliana, adotou a teoria
unitária da responsabilidade, que autoriza a responsabilização do causador do dano pelo fato do produto ou serviço ainda que inexistente relação jurídica negocial entre as partes.
Dispõem os arts. 12 e 14 do Código de Defesa do Consumidor:
Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de
culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem,
fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.
Art. 14. fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação de serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre a fruição e
riscos.
Assim, em se tratando de relações de consumo a responsabilidade civil se aperfeiçoa mediante o concurso de três pressupostos: a)
defeito do produto ou serviço, b) evento danoso; e c) relação de causalidade entre o defeito do serviço e o dano, elementos estes
devidamente configurados na hipótese.
Acerca do defeito no serviço, este é evidente. Inicialmente, é válido registrar que o entendimento sumulado – portanto vinculante – do
STJ é no sentido de que as instituições financeiras respondem objetivamente por fraudes provocadas por terceiros no âmbito das suas
operações. Neste sentido:
Súmula 479 - As instituições financeiras respondem objetivamente pelos danos gerados por fortuito interno relativo a fraudes e delitos
praticados por terceiros no âmbito de operações bancárias.
Tal entendimento não é sem razão e se justifica em situações como a dos autos. A experiência prática tem demonstrado que as instituições financeiras, que tanto investem em publicidade e em mecanismos de segurança da informação, não são criteriosas no controle
de fraudes na contratação de empréstimos consignados o que se dá claramente pelo lucro que daí advém.
Estes empréstimos fraudulentos, no mais das vezes, tem como vítimas pessoas aposentadas, idosas, de pouca condição financeira
e de notório déficit informacional que, por sua própria condição são hipervulneráveis, facilitando a consecução das fraudes. A rigor, o
pouco critério que se observa na prática se dá pelo fato de que um pequeno percentual das vítimas destas ações procura o Poder Judiciário para questionar as “contratações”, o que faz com que haja um claro lucro da intervenção em favor destas instituições financeiras.
Em que pese a experiência revele que há grande número de demandas predatórias nas quais os consumidores reclamam contra
créditos que foram efetivamente solicitados e utilizados, esta também revela que não é incomum se observar descontos efetivamente
levados a cabo por empréstimos não contratados.
Com efeito, as instituições financeiras não são vítimas dos empréstimos fraudulentos, são coniventes com estes, uma vez que, dispondo de mecanismos aptos a impedir fraudes, fazem “vista grossa” a falsificações grotescas, como a que se verifica na hipótese porque
sabe que irá lucrar com isto, mesmo que realizando o pagamento do “valor solicitado” nas contas dos consumidores.
E a conivência das instituições financeiras se pode extrair de situações como a do caso nos autos quando se observa que a contestação traz dois documentos de identificação diferentes que a ré reputa serem do autor. Com efeito, do bojo da contestação se vê carteira
de identidade notoriamente falsificada que teria sido utilizada na contratação. Ladeadas, a carteira original do autor com a apresentada