TJBA 26/07/2022 - Pág. 2010 - CADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.144 - Disponibilização: terça-feira, 26 de julho de 2022
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Requereu, por fim: I) a concessão dos benefícios da Justiça Gratuita; II) liminarmente, a concessão do pedido de tutela provisória
de urgência; IV) a devolução dos valores descontados em dobro; bem como condenar a parte Ré a indenizar a parte Autora,
a título de danos morais, no valor de R$ 5.000,00 com correção monetária com base no INPC a partir da data do arbitramento
(Súmula 362, STJ), e juros à taxa legal computada a partir do evento danoso (Súmula 54, STJ); V) por fim, a condenação do Réu
ao pagamento das verbas de sucumbência.
Inicial instruída com documentos sob ID 82135636 ao 82135514.
Pedido de gratuidade de justiça deferido. Determinou-se a inversão do ônus da prova. Tutela antecipada deferida. (ID 82230436)
Devidamente citada, a parte ré ofereceu contestação sob ID 85218779. Preliminarmente, arguiu a ausência de verossimilhança
das alegações autorais, bem como a falta de interesse de agir da parte autora. No mérito, afirmou que a documentação acostada
aos autos torna indiscutível o fato de que o produto foi apresentado de forma clara e que permitiu à autora identificá-lo de forma
correta. Por fim, pugnou pela improcedência da presente demanda.
Com a contestação foram acostados documentos sob ID 85218779 ao 85218869.
Réplica sob ID 91864405.
É o relatório.
Posto isso. Decido
O feito já está instruído, não havendo necessidade de produzir outras provas, visto que a matéria de mérito ventiladas nos autos
é unicamente o julgamento antecipado da lide (art. 355, NCPC).
Inicialmente, cumpre-me analisar as preliminares suscitadas pela parte requerida, quais sejam: arguiu a ausência de verossimilhança das alegações autorais, bem como a falta de interesse de agir da parte autora
A requerida arguiu a ausência de verossimilhança nas alegações autorais, ocorre que, essa análise é realizada pela magistrada
no curso do processo, mediante as provas anexadas aos autos da presente lide, o que resultará na procedência ou improcedência da ação. Diante o exposto, rejeito a preliminar suscitada.
A respeito do interesse processual, leciona Humberto Theodoro Júnior:”O interesse de agir, que é instrumental e secundário,
surge da necessidade de obter através do processo a proteção ao interesse substancial. Entende-se, dessa maneira, que há interesse processual se a parte sofre um prejuízo, não propondo a demanda, e daí resulta que, para evitar esse prejuízo, necessita
exatamente da intervenção dos órgãos jurisdicionais.”
Localiza-se o interesse processual não apenas na utilidade, mas especificamente na necessidade do processo como remédio
apto à aplicação do direito objetivo no caso concreto, pois a tutela jurisdicional não é jamais outorgada sem necessidade, como
adverte Allorio. Essa necessidade se encontra naquela situação que nos leva a procurar uma solução judicial, sob pena de, se
não fizermos, vermo-nos na contingência de não podermos ter satisfeita uma pretensão (o direito de que nos afirmamos titulares). Vale dizer: o processo jamais será utilizável como simples instrumento de indagação ou consulta acadêmica. Só o dano ou
perigo de dano jurídico, representado pela efetiva existência de uma lide, é que autoriza o exercício do direito de ação.
Na hipótese em exame, por óbvio, há interesse de agir da parte autora, no que tange aos pedidos de declaração da inexistência
da relação contratual, a devolução dos valores descontados em dobro, e no pedido de indenização, na medida em que alega ter
sofrido danos morais, em virtude ter recebido cartão de crédito que não contratou, e diante de tal inconveniente, tem tido prejuízos, visto que nunca consegue findar seus débitos com a ré.
Com essas considerações, rejeito a preliminar de falta de interesse processual.
Superadas as questões preliminares, passo à análise do mérito.
Aduz o autor, em inicial, que, imaginando celebrar um contrato de empréstimo consignado comum, acabou por aderir, inadvertidamente, a um contrato de empréstimo do tipo RMC, cuja nulidade defende. Assiste-lhe razão. Assim, revela-se que a questão
versa sobre relação de consumo, tendo em vista a existência de relação contratual entre as partes, com base nos arts. 2º, 3º e
14 do CDC, seja em decorrência da fraude praticada por terceiros, que configura falha na prestação do serviço, ou pela relação
contratual estabelecida de fato entre as partes, seguindo os pressupostos necessários.
Em contestação, a parte ré apresentou detalhes da contratação da autora e juntou aos autos cópia de contrato do cartão consignado com a assinatura da parte autora, não tendo a assinatura de tal documento sido impugnada pela autora, bem como algumas
faturas apenas demonstrando os encargos sem haver efetivas compras.
Da análise dos autos, verifica-se que, de fato, a parte ré promoveu descontos no contracheque da parte autora, a título de pagamento de suposto contrato de empréstimo consignado celebrado entre as partes.
Pois bem, o requerido junta contrato aos autos, todavia, não há nenhuma prova de que foi esse o tipo de contrato firmado com a
parte autora ou que as devidas informações foram passadas à requerente anteriormente.
O que se evidencia é que o réu fornece empréstimos intermináveis, sem prestar qualquer informação ou suporte ao consumidor,
fazendo com que suas dívidas com o banco se transformem em “ bolas de neve”, ou seja, só tendem a piorar.
É de se reconhecer, de fato, a abusividade desta espécie de avença.
Em se tratando de contrato de financiamento, cumpre ao banco informar, com clareza e exatidão, o montante dos juros de mora,
os acréscimos legalmente previstos e, notadamente, o número e periodicidade das prestações.
Trata-se da dicção do artigo 52, do CDC, ora transcrito:
“Art. 52 - No fornecimento de produtos ou serviços que envolva outorga de crédito ou concessão de financiamento ao consumidor, o fornecedor deverá, entre outros requisitos, informá-lo prévia e adequadamente sobre:
I - preço do produto ou serviço em moeda corrente nacional;
I - montante dos juros de mora e da taxa efetiva anual de juros; III - acréscimos legalmente previstos;
IV - número e periodicidade das prestações; V - soma total a pagar, com e sem financiamento.”
No caso dos cartões consignados, as instituições financeiras se utilizam de um formulário bem parecido com aquele empregado
para a contratação de empréstimos consignados em folha, aos quais já se encontram acostumados os consumidores padrão
deste tipo de produto, aposentados, pensionistas ou servidores públicos.
No entanto, ao contrário do que ocorre com o empréstimo consignado, esta modalidade de contratação impede que o mutuário
conheça, de antemão, o número e os valores exatos das parcelas que terá de pagar para quitação da dívida, uma vez que esta