TJSP 04/07/2012 - Pág. 2026 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quarta-feira, 4 de Julho de 2012
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano V - Edição 1217
2026
como lícita.
Nos crimes contra o patrimônio, sumamente importante é a palavra do ofendido, desde que coerente e
segura (como no caso), sendo, talvez, a mais valiosa peça de convicção judicial. Assim, em que pesem as bem lançadas razões
defensivas, não vislumbro, no caso em apreço, uma intenção da vítima em acusar o réu pura e simplesmente.Não é razoável
exigir absoluta precisão das testemunhas e vítima ao relatarem o ocorrido. O passar do tempo tem sim o condão de apagar
detalhes da memória, tornando ainda mais verossímil a prova testemunhal quando não seguida de uma exatidão próxima da
artificialidade.Portanto, estão presentes todos os pressupostos necessários à responsabilização do acusado pelo delito tipificado
no art. 155, parágrafo 4º, inciso I c/c art. 14, inciso II, ambos do Código Penal, haja vista que o furto não se consumou por
circunstâncias alheias à vontade de MARCELO, diante da ação corajosa de populares que o detiveram assim que saia da
residência subtraída.Resta a quantificação da reprimenda.Primeira fase (art. 59, CP):Não há nos autos informações
desabonadoras pertinentes aos motivos, circunstâncias e consequências do crime, tampouco notícia acerca do comportamento
da vítima. Também não se pode majorar a reprimenda com base em inquéritos ou ações penais em curso, conforme enunciado
sumular nº 444, do C. Superior Tribunal de Justiça. Há prova de má conduta social de MARCELO, pois foi reconhecido
definitivamente como incurso em tipo penal por fato praticado em maio de 2003 [v. certidão de fl. 19, apenso (data do fato em
julgamento: 22/10/2011; data do trânsito em julgado da absolvição imprópria considerada: 23/05/2005; sanção aplicada:
internação)]. Idem quanto a fato ocorrido em janeiro de 2004 [v. certidão de fl. 20, apenso (data do fato em julgamento:
22/10/2011; data do trânsito em julgado da absolvição imprópria considerada: 12/04/2005; sanção aplicada: internação)] e em
novembro de 2004 [v. certidão de fl. 21, apenso (data do fato em julgamento: 22/10/2011; data do trânsito em julgado da
absolvição imprópria considerada: 12/07/2007; sanção aplicada: internação)]. Tem-se, também, a certidão de fl. 27 [(data do
fato em julgamento: 22/10/2011; data do trânsito em julgado da absolvição imprópria considerada: 15/01/2009; sanção aplicada:
atendimento ambulatorial)].Por isso majoro a reprimenda na metade, que reputo bastante razoável e consentâneo ao vasto
antecedente criminal do averiguado. Dessa forma, a sanção inicial alcança 3 (três) anos de reclusão, acrescidos de 15 (quinze)
dias-multa.Segunda fase (arts. 61 a 66, CP):Sem atenuantes. A condenação do réu como incurso no art. 28 da Lei de Tóxicos (fl.
31) não enseja reincidência. Se o próprio crime de porte para uso próprio de estupefacientes não enseja (nunca) pena de prisão,
a fortiori se mostra injusto tomar uma condenação anterior por fato idêntico como argumento de majoração da reclusão.De outra
banda, absolvições impróprias não importam em reincidência, por força do art. 63 do Código Repressor.Porém, a certidão de fl.
33 do apenso próprio noticia condenação definitiva de MARCELO [(data do fato em julgamento: 22/10/2011; data do trânsito em
julgado da condenação considerada: 14/07/2011; sanção aplicada: 9meses e 10 dias de reclusão + 3 dias-multa no piso)].
Majoro a sanção em 1/6 (um sexto), alcançando 3 (três) anos e 6 (seis) meses de reclusão, acrescidos de 17 (dezessete) diasmulta.Terceira fase:Há duas causas de diminuição (tentativa e semi-imputabilidade). Com razão o Ministério Público ao postular
o redutor mínimo, haja vista que o réu considerando o iter criminis esteve prestes a manter consigo a res furtiva, tanto que a
retirou da residência invadida e foi obstaculizado por populares já na rua.No tocante à causa redutora do art. 26, parágrafo
único, do Código Penal, reforço que o laudo de fls. 42/43 do apenso reconheceu a necessidade de internação hospitalar ao réu,
demonstrando que o mesmo não possuía, ao tempo da ação, plena capacidade intelectiva. O mesmo fundamento que me
forçará substituir a pena privativa de liberdade, indica a necessidade de aplicação máxima do redutor.Portanto, torno definitiva a
pena de 9 (nove) meses e 10 (dez) dias de reclusão, acrescida de 4 (quatro) dias-multa.Considerando não haver prova de
possuir, o réu, elevada capacidade econômica, fixo o dia-multa em 1/30 (um trinta avos) do salário mínimo nacional vigente à
época dos fatos.O regime inicial de cumprimento de pena privativa de liberdade será o semiaberto, de acordo com o art. 33, §2º,
alínea b, do Código Penal, frente à reincidência e aos maus antecedentes indicados na primeira fase.SubstituiçõesConvém
observar que o acusado é semi-imputável, conforme atestado pelo perito às fls. 42/43 do apenso correlato (homologado à fl. 48
sem qualquer oposição das partes).O experto informou que MARCELO iniciou uso de maconha aos 12 (doze) anos e aos 16
(dezesseis) introduziu-se no consumo de cocaína e crack. Assim permaneceu até os 18 (dezoito), ocasião em que fora detido.
Iniciou o uso de etílicos em excesso aos 23 anos, consumindo-os diariamente (fl. 42). No delito em pauta, refere que (...) havia
utilizado meio litro de conhaque e na verdade tem pouca lembrança de seu furto (ibidem). Fez tratamento em hospital psiquiátrico,
passando também por tratamento ambulatorial em Piedade.Em suma, o perito informa que o periciando apresenta Síndrome de
Dependência por etílicos, transtorno mental caracterizado por intenso desejo de consumo, descontrole no uso e síndrome de
abstinência.Concluiu que o acusado tinha plena capacidade de entender o caráter ilícito do fato e parcial capacidade de
determinar-se de acordo com esse entendimento (fl. 43).Concessa vênia, não se vislumbram contradições no laudo em
referencia, pese o esforço da Defesa nesse sentido. Vejo que os quesitos do Ministério Público, da Defesa e do Juízo foram
adequadamente respondidos pelo profissional subscritor daquele trabalho, não havendo qualquer incongruência.Diante disso,
abrem-se dois caminhos: ou a aplicação de medida de segurança ou a imposição de sanção penal com o redutor correspondente
(artigos 26, parágrafo único, e 98, ambos do Código Penal) já arbitrada acima.Entendo que neste caso é prudente seguir a
orientação do experto judicial no sentido de que o réu deve fazer tratamento hospitalar por 2 meses (...). Sugeriu internação
hospitalar inicialmente por 2 meses (fl. 43, quesito 7 da Defesa).Ademais, observo das certidões juntadas às fls. 19, 20, 21, 24
e 27 (apenso próprio), que já foram impostas a MARCELO medidas de segurança, à época reconhecendo a sua inimputabilidade.
No caso presente, há de se concluir que a prisão em nada o auxiliará na ressocialização, mormente diante do reconhecimento
de sua periculosidade (fl. 43, quesitos 6 e 7 do MP). Aliás, o seu prognóstico é ruim (fl. 43, quesito 9 do MP) em caso de
ausência de tratamento ou de tratamento inadequado (v. fl. 25).Creio que diante de tanto envolvimento do réu em delitos
patrimoniais, jogá-lo em uma cela sem observação médica relevante o forçará a reincidir, ampliando ainda mais o leque de
infrações, em uma espiral criminosa interminável.Reproduzo o disposto no art. 98 do Código Repressor: Na hipótese do
parágrafo único do art. 26 deste Código e necessitando o condenado de especial tratamento curativo, a pena privativa de
liberdade pode ser substituída pela internação, ou tratamento ambulatorial, pelo prazo mínimo de 1 (um) a 3 (três) anos, nos
termos do artigo anterior e respectivos §§ 1º a 4º.No caso, a medida de segurança deve ser a internação, por tratar-se de delito
apenado com reclusão (art. 97, Código Penal), bem como em face do parecer médico lavrado.C O N C L U S Ã ODiante de todo
o exposto, julgo procedente a ação penal e, declarando MARCELO CHARLES CAMARGO incurso no artigo 155, §4º, inciso I c/c
artigo 14, inciso II, ambos do Código Penal, condeno-o à pena privativa de liberdade consistente em 9 (nove) meses e 10 (dez)
dias de reclusão, a serem descontados em regime inicial semiaberto, tudo acrescido de 4 (quatro) dias-multa no piso (1/30 avos
do salário mínimo nacional vigente à época dos fatos).Com fundamento no art. 98 do Código Penal, substituo a sanção corporal
por medida de segurança de internação por prazo indeterminado, perdurando enquanto não for averiguada, mediante perícia
médica, a cessação de periculosidade. Prazo mínimo de 2 (dois) meses, conforme laudo de fl. 43 (quesito 7 da Defesa),
oportunidade na qual será realizada nova perícia médica.O internado será recolhido a estabelecimento dotado de características
hospitalares e será submetido a tratamento adequado (art. 99, Código Penal). Expeça-se o necessário para seu início.Com o
trânsito em julgado, lance-se o nome do réu no rol dos culpados.Os pressupostos da custódia cautelar permanecem íntegros,
reforçados pela conclusão alcançada em Sentença. O réu não poderá recorrer em liberdade.P.R.I.C.Piedade, 29 de junho de
2012.Henrique Maul Brasilio de SouzaJuiz Substituto. - Advogados: RENATA LOPES ESCANHOELA ALBUQUERQUE - OAB/SP
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