TJSP 01/04/2015 - Pág. 2013 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quarta-feira, 1 de abril de 2015
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano VIII - Edição 1858
2013
se de pretensão fundada na abusividade da cobrança dessas taxas do consumidor, tornando-as, por consequência, indevidas.
O pedido da parte autora funda-se no artigo 51, inciso IV, CDC, dispositivo específico para regular a relação jurídica de consumo
ora em debate, prevendo a nulidade das cláusulas consideradas abusivas. Nesse passo, tendo em vista que as normas
referentes à prescrição são restritivas de direito, razão pela qual, não podem ser interpretadas por analogia ou ampliativamente,
no presente caso incide a regra geral do artigo 205 do Código Civil, cujo prazo prescricional é de 10 anos. No mérito, a ação é
procedente em parte. 1. Prazo de tolerância para entrega do imóvel Com relação à alegada abusividade da cláusula contratual
que prevê a tolerância de 180 dias para a entrega do imóvel, não merece acolhida a insurgência da autora. Isso porque, tendo
em vista a complexidade da obrigação em questão (execução de obra), a previsão de prazo de tolerância para seu cumprimento
decorre da possibilidade de ocorrências de contratempos inerentes à atividade da construção civil. Nesse sentido, a previsão do
prazo de tolerância assinala ao consumidor a possibilidade de atraso nas obras por prazo razoável (180 dias), cumprindo o
fornecedor com seu dever de informar previsto na norma consumeirista, que decorre do princípio da boa-fé, regente das relações
civis em geral. Portanto, sendo o prazo razoável, a cláusula afigura-se legítima, o que afasta a alegada abusividade. 2. Atraso
na entrega do imóvel mora da parte ré A data estabelecida para a entrega do imóvel foi 01/07/2011, com previsão de tolerância
de 180 dias (fls. 44). Assim, verifica-se que a parte autora detinha expectativa de receber o bem em janeiro de 2012. Porém, o
“habite-se” da obra somente foi concedido em 14/08/2012 (fls. 113). Havendo termo prefixado para a entrega do bem, a mora
opera-se de pleno direito desde o dia do vencimento de acordo com o brocardo dies interpellat pro homine, segundo determina
o art. 398, caput, do Código Civil. Desta forma, tendo em vista que a impossibilidade de entrega no prazo ajustado em contrato,
decorrente da ausência de licença, à qual a recorrente havia se comprometido em obter, configurada a culpa da mesma, cuja
demonstração, de toda sorte seria desnecessária por força da responsabilidade objetiva fixada pelo Código de Defesa do
Consumidor. Motivo pelo qual se impõe à parte ré o dever de indenizar os prejuízos sofridos pela parte autora a partir de 01 de
janeiro de 2012. 3. Aplicação recíproca da multa moratória Não assiste razão à parte autora no que se refere à necessidade de
inversão da cláusula penal que prevê a incidência de multa e juros em caso de atraso no pagamento. Com efeito, na inteligência
do artigo 51 do Código de Defesa do Consumidor as cláusulas abusivas, exemplificadas nos incisos do referido dispositivo, são
nulas de pleno direito. Desta forma, ao juiz somente é permitido reconhecer a nulidade da cláusula penal prevista unilateralmente,
em desfavor apenas do consumidor, colocando-o em excessiva desvantagem por impor obrigação sem a devida correspondência
ao fornecedor. 4. Congelamento do saldo devedor Não assiste razão à parte autora no que se refere ao congelamento do saldo
devedor pelo período de atraso da obra. A atualização do saldo, mesmo no período de inadimplência, não se mostra abusiva,
porquanto visa apenas adequar o valor aquisitivo da moeda por meio da correção monetária. Nesse passo, possível se afigura
a adoção da correção pelo INCC, mesmo durante o período da obra, pois é o indexador que reflete os custos da construção civil
e foi expressamente pactuado entre as partes, sendo indevido o seu afastamento. 5. Despesas de condomínio As requeridas ao
não cumprir a obrigação de entregar o imóvel na data aprazada, não poderiam exigir o pagamento de taxas condominiais antes
da tradição. A responsabilidade das taxas condominiais é da construtora até a data da imissão de posse por parte do promitentecomprador. Ainda que o contrato firmado entre as partes estabelecesse a possibilidade de tal cobrança, trata-se de contrato de
adesão, sendo abusiva a cláusula que impõe obrigação que coloca o consumidor em excessiva desvantagem, como no caso em
tela, permitindo o reconhecimento de sua nulidade. Portanto, verifica-se a abusividade na cobrança em exame, diante da
ausência de justificativa para responsabilização da parte autora a pagar por taxa de condomínio que sequer podia ocupar, pois
a cobrança somente passou a ser legítima com a entrega das chaves ao proprietário, razão pela qual os valores pagos
indevidamente devem ser restituídos. 6. Comissão de corretagem De regra, a obrigação de pagamento de comissão de
corretagem é do promitente vendedor, segunda a dicção do art. 490 do Código Civil, não se legitimando o alcance pelo
comprador, quando não comprovada estipulação em sentido contrário e caracterizada a atuação do corretor de modo autônomo
e com exclusividade, de modo a legitimar a cobrança do valor devido. Ocorre que na hipótese dos autos, a situação é peculiar,
evidenciando o conhecimento e a pactuação do pagamento da comissão de corretagem pela parte autora (comprador). É o que
se depreende dos documentos acostados às fls. 48/54, aliados ao documento de fls. 108/112, pois o valor da corretagem não
integrou o preço. Neste contexto, pelos documentos mencionados, mormente os recibos de pagamento da comissão, inviável a
restituição dos valores pagos a este título, pois comprovada a não somente a ciência, mas e, sobretudo, a concordância dos
demandantes. Verifica-se, assim, terem sido observados os princípios da transparência e da informação devidos ao consumidor,
em consonância ao artigo 6°, inciso III e ao artigo 46, ambos do Código de Defesa do Consumidor, não havendo abusividade ou
ilegalidade na referida cobrança. 7. SATI A cobrança de taxa de serviços técnico (SATI) é ilegal, por não restar claro o serviço
prestado a tal título, e devem ser restituídos os valores pagos a esse título. Não houve, ademais, comprovação pela parte ré da
prestação de quaisquer serviços nos moldes do estabelecido no Termo de Ajustamento de Conduta, procedimento n. 49/02. 8.
Restituição dos valores pagos indevidamente Dispõe o artigo 42, parágrafo único, do Código de Defesa do Consumidor, que a
cobrança de quantia indevida gera direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido
de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável. Nesse passo, o Tribunal de Justiça de São Paulo
possui precedentes no sentido de que não se pode presumir a má-fé nas hipóteses de cobrança indevida, exigindo-se prova
dessa intenção para que seja autorizada a repetição em dobro. Portanto, não havendo prova da má-fé da requerida, incabível a
repetição em dobro dos valores pagos em excesso pela parte autora, que deverão ser restituídos de forma simples, corrigidos
monetariamente pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça de São Paulo a partir do desembolso e com incidência de juros de
mora de 1% ao mês a contar da citação. 11. Danos materiais lucros cessantes Caracterizado o atraso injustificado na entrega do
imóvel, deve a parte ré ressarcir a autora pela privação injusta do uso do bem. O montante a ser ressarcido deve guardar
relação com o valor dos aluguéis que poderiam ter sido percebidos pela parte autora A jurisprudência do Tribunal de Justiça de
São Paulo tem fixado o valor dos aluguéis mensais devidos no correspondente a 0,5% do valor atualizado do imóvel: Ementa:
COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA. SENTENÇA QUE JULGOU IMPROCEDENTE O PEDIDO. ATRASO NA ENTREGA DA
OBRA VERIFICADO. INDENIZAÇÃO POR LUCROS CESSANTES. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO COM MULTA. BIS IN
IDEM E FALTA DE PREVISÃO NO CONTRATO. CONGELAMENTO DO SALDO DEVEDOR. CORREÇÃO MONETÁRIA. DANO
MORAL VERIFICADO. 1. ATRASO INJUSTIFICADO NA ENTREGA DA UNIDADE PROMETIDA À VENDA À AUTORA. Não há
como afastar a responsabilidade pela mora no cumprimento da obrigação, visto que empresas do porte da ré, que atuam há
anos no mercado imobiliário, devem se ajustar a eventuais embaraços para finalizar a obra que se comprometeu a vender. Os
motivos alegados pela ré configuram o que se convenciou chamar fortuito interno, e, assim, não têm poder liberatório da
obrigação. 2. LUCROS CESSANTES. A indenização por lucros cessantes corresponde à privação injusta do uso do bem e
encontra fundamento na percepção dos frutos que lhe foi subtraída pela demora no cumprimento da obrigação. O uso pode ser
calculado economicamente pela medida de um aluguel, que é o valor correspondente ao que deixou de receber ou teve que
pagar para fazer uso de imóvel semelhante. A base de cálculo da reparação por lucros cessantes ou percepção dos frutos deve
ser fixada em percentual equivalente a 0,5% sobre o valor atualizado do imóvel. (...) 6. Sentença reformada para julgar
parcialmente procedente o pedido. Recurso parcialmente provido. (1084830-19.2013.8.26.0100 Apelação / Promessa de Compra
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