TJSP 01/06/2020 - Pág. 3413 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: segunda-feira, 1 de junho de 2020
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano XIII - Edição 3052
3413
de perícia médica (fls. 88/92). Laudo pericial juntado às fls. 130/137. Manifestação da autora sobre o laudo às fls. 141/142.
Parecer final do Ministério Público às fls. 147/148. Manifestação da Curadora Especial nomeada às fls. 151/153, pugnando pela
procedência do pedido em razão da conclusão do perito judicial pela incapacidade da interditanda. É o relatório. Fundamento e
Decido. Não foram arguidas preliminares, de modo que inicio a análise do mérito. Com efeito, dispõe o art. 1775 e §§ do Código
Civil: “Art. 1.775. O cônjuge ou companheiro, não separado judicialmente ou de fato, é, de direito, curador do outro, quando
interdito. § 1º Na falta do cônjuge ou companheiro, é curador legítimo o pai ou a mãe; na falta destes, o descendente que se
demonstrar mais apto. § 2º Entre os descendentes, os mais próximos precedem aos mais remotos. § 3º Na falta das pessoas
mencionadas neste artigo, compete ao juiz a escolha do curador.” (grifei). Ainda de forma mais específica, dispõe o art. 747,
inciso II, do Novo Código de Processo Civil: “Art. 747. A interdição pode ser promovida: (...) II pelos parentes ou tutores” Da
leitura dos dispositivos supra, extrai-se que, em regra, o Diploma Civil aponta o cônjuge ou companheiro do interditando como,
de direito, seu curador. Na falta deles, serão curadores os pais do interditando e, na falta destes, os descendentes, sendo que,
entre estes, os mais próximos precedem aos mais remotos e, respectivamente, o dispositivo do Diploma Processual Civil elenca
especificadamente que a interdição pode ser promovida pelos parentes ou tutores. Em que pese a sobredita ordem legal de
legitimação para a curatela do interdito, entendo que tal ordem não pode, de maneira alguma, privilegiar determinado legitimado
em detrimento dos interesses do incapaz. Em outras palavras: a ordem de legitimação pode ser mitigada quando um legitimado
mais remoto detiver condições de melhor atender aos interesses do incapaz. No caso concreto, contudo, não obstante tal
entendimento, verifico que a parte requerente, genitora da interditanda, reúne condições para exercer o encargo ora pretendido.
Por outro lado, a incapacidade da requerida também restou evidenciada. O laudo de fls. 130/137, elaborado pelo “expert” do
juízo, atestou o seguinte acerca da interditanda: “é pessoa que apresenta comprometimento do raciocínio lógico. Tem dificuldade
para exprimir desejos e necessidade, precisa de auxílio para imprimir diretrizes de vida. Incapaz para os atos de vida negocial e
patrimonial, como fazer empréstimos, conciliar, dar quitação, alienar, hipotecar, demandar ou ser demandado, praticar atos que
não sejam de mera administração, bem como manejar pequenas quantias de dinheiro. Necessita de supervisão para vida diária,
mas pode manter higiene básica, cuidados com o lar desde que sob supervisão... Concluiu o perito que levando em conta as
limitações da requerida, devido ao seu transtorno mental, é necessário um curador definitivo, eis que a interditanda tem
dificuldades de praticar sozinho atos negociais da vida civil. Assim, considerando a aptidão da requerente para o exercício do
munus, bem como tendo em vista o arcabouço probatório coligido aos autos acerca da incapacidade da interditanda, a presente
ação merece juízo de procedência. Cumpre salientar que, em 02/01/2016, passou a vigorar o Estatuto da Pessoa com Deficiência,
Lei 13.146 de 06 de julho de 2015. Segundo este novo diploma legal, por ficção jurídica, não existe mais pessoa absolutamente
incapaz, com exceção dos menores de 16 (dezesseis) anos. Logo, considerando que o instituto da interdição apenas é aplicável
a maiores de 18 (dezoito) anos, não há falar-se mais em interdição total, que era aquela que reconhecia, por meio de sentença
declaratória, a incapacidade absoluta do interdito de praticar qualquer ato da vida civil. Em razão desta alteração legal, a
curatela deverá ter seus limites definidos em cada caso concreto e, muitas vezes, poderá se limitar à assistência do curador
para que o curatelado possa praticar atos de disposição patrimonial; porém, noutros casos (v.g. curatelado com gravíssimo
estado de saúde, sem qualquer discernimento), poderá a curatela consistir na necessidade de o curador representar o curatelado
em determinados atos da vida civil. Em suma, com o advento do Estatuto da Pessoa com Deficiência , houve uma modificação
na matéria de capacidade para o exercício de atos na vida civil. No caso sub judice, a incapacidade, após a Novel Lex, portanto,
deverá estar adstrita a atos negociais, devendo a requerida ser classificada como relativamente incapaz. A propósito, esta foi a
posição sustentada pelo Ministério Público a fls. 147/148 destes autos. No caso em tela, a interditanda não possui patrimônio.
Assim, entendo que a curadora deve ser dispensada da prestação de contas. É que a finalidade do dispositivo é proteger o
patrimônio do interditando, o que não existe (ou não tem expressão) no caso. Ademais, não há qualquer indicativo de que a
curadora não seja pessoa idônea. Assim já decidiu o TJSP, conforme abaixo: “INTERDIÇÃO. Laudos periciais que demonstram
ser o interditando incapaz para os atos da vida civil. Sentença que julgou procedente ação de interdição. Desnecessidade de
prestação de contas pelo curador. Pessoa idônea, como confessada pelo interditando. Artigo 1190 do CPC. Recurso tendente a
alterar a sentença desprovido” (TJSP, Ap nº. 0001506-53.2008.8.26.0156, Rel. Des. Teixeira Leite, j. 10/03/2011). Constou do
corpo do acórdão o seguinte: “Nesse vértice, de rigor manter a r. sentença, inclusive no que concerne à dispensa de prestação
de contas, já que os rendimentos do interditado não se mostram consideráveis, e serão consumidos com as despesas pessoais
e do lar. Ademais, e como bem, ressaltou o MM. Juiz, o curador, pessoa idônea, como confessado pelo próprio interditando
(artigo 1190 do CPC), teria direito de ser remunerado pelo exercício deste encargo”. Já nos autos da Apelação nº. 913282367.2009.8.26.0000, j. 14/07/2009, sendo Relator o Desembargador Morato de Andrade, constou do corpo do acórdão o seguinte:
“A ação, portanto, fica julgada parcialmente procedente, nomeando-se a autora curadora da requerida. Considerando que ela
não tem bens imóveis, mas apenas direito ao recebimento da aposentadoria e de benefício previdenciário decorrente do
falecimento de seu marido, a autora fica dispensada de futura prestação de contas, porquanto tal renda se destina à satisfação
das necessidades básicas da curatelada. Desnecessária também a publicação de editais, pois a requerida é mentalmente
capaz”. Portanto, o pedido inicial, consistente na interdição com nomeação da autora como curadora, colhe foros de prosperidade.
ANTE O EXPOSTO e considerando tudo o que mais dos autos consta JULGO PROCEDENTE o pedido inicial, extinguindo o
processo, nos termos do art. 487, inciso I, do Novo Código de Processo Civil, o que faço para o fim de declarar JULIANA
GOMES RIBEIRO relativamente incapaz e, por consequência, reconheço a sua INCAPACIDADE CIVIL PARCIAL, de modo que
a curatelada não poderá praticar, sem a intervenção da curadora, determinados atos da vida civil, tais como: receber proventos
ou benefícios previdenciários, ou qualquer importância em dinheiro ou representada por cheque, promissória, letra de câmbio,
duplicata mercantil e/ou outro documento caracterizado ou não como título de crédito que a autorize a receber quantia certa ou
incerta em pecúnia e/ou em espécie, sendo-lhe também vedado, diretamente, realizar negócios jurídicos com instituições de
créditos e/ou bancos e/ou instituições financeiras, inclusive no que toca a eventuais pedidos de emissão de cheques e/ou de
cartões magnéticos ou outros atos civis de que possa resultar para si própria ou para sua família prejuízo financeiro. É-lhe
também vedado, diretamente, realizar a compra e venda de bens imóveis e/ou de móveis que guarneçam ou não sua residência,
contratos de troca, de permuta ou de comodato, assim como emprestar, transigir, dar quitação, hipotecar, demandar ou ser
demandada em juízo ou em sede administrativa e, enfim, praticar qualquer ato que implique em disposição patrimonial.
Independente do trânsito em julgado, NOMEIO a requerente CLAUDIA APARECIDA RIBEIRO curadora de JULIANA GOMES
RIBEIRO, incumbindo-lhe prestar o compromisso definitivo no prazo de 05 (cinco) dias, observando-se, no entanto, que a
curatela que a autora exercerá em favor da requerida é parcial e limitada aos negócios jurídicos da vida civil concernentes a seu
patrimônio material e que a curadora está autorizada a representar (e não apenas a assistir) a curatelada na prática de todos os
atos da vida civil de caráter patrimonial. Fica a curadora dispensada da prestação de contas anualmente, nada obstando que
tenha de fazê-lo caso instada para tanto (art. 553, caput, e parágrafo único, do CPC/2015). Cumpram-se as disposições contidas
no art. 9º, III, do Código Civil. Desnecessária a prestação de caução, dada a idoneidade da curadora. Inscreva-se a presente
sentença no registro de Pessoas Naturais e publique-se a pela Imprensa Oficial por 03 (três) vezes, com intervalo de 10 (dez)
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º