TJSP 04/08/2020 - Pág. 3670 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: terça-feira, 4 de agosto de 2020
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I
São Paulo, Ano XIII - Edição 3098
3670
no dia 16/07/18, encaminhou todos os documentos solicitados para análise ao posto de atendimento da ré e foi informado que o
período para uma possível resolução do caso levaria 21 dias úteis. Contudo, até o momento, o autor a bagagem não foi
localizada, tampouco o autor foi ressarcido pelos danos materiais sofridos, que atingem a monta de R$ 8.718,00 (oito mil,
setecentos e dezoito reais), além dos gastos que teve no importe de R$ 2.450,00 e R$ 1.365,00 (empréstimo solicitado a seu
primo). Em virtude do exposto, alega que também sofreu danos de ordem extrapatrimonial. Requereu: condenação da ré ao
pagamento de indenização pelos danos materiais, no valor total de R$ 12.533,00 (doze mil, quinhentos e trinta e três reais)
referentes aos bens extraviados e gastos de emergência, que deverão ser devidamente corrigidos monetariamente e acrescidos
de juros moratórios, desde a época dos fatos até a data de hoje; condenação da ré ao pagamento de indenização por danos
morais a serem arbitrados, no montante de R$ 20.000,00 (vinte mil reais). Devidamente citada, a requerida contestou alegando
que incide na hipótese a limitação prevista pelo artigo 22 da Convenção de Montreal, sendo que caberia ao autor no momento
do check-in, realizar declaração especial com o valor exato do que transportava. Afirma que prestou total assistência ao autor
durante o ocorrido, bem como, após a comprovação do extravio definitivo, procedeu, em 04/09/2018, a oferta de restituição
imediata da quantia de R$ 3.215,00, proposta essa não aceita pelo autor. Aduz que o valor ofertado, corresponde a restituição
dos bens arrolados pelo autor, subtraído o valor daqueles que não deveriam estar dentro da mala despachada, por ter maior
valor material ou sentimental, conforme consta na cartilha da ANAC e site da ré. Sustenta ainda que há uma placa exibida junto
ao check-in da ré, na qual, mais uma vez ressalta o fato de que dinheiro e bens de valor não deverão ser despachados, porém
o autor não seguiu as orientações já que pede ressarcimento de dinheiro e de um notebook. Narra que o autor não comprovou
os danos sofridos, tampouco as alegadas despesas que teria sofrido em razão da ausência de sua bagagem ter sido extraviada,
a gerar a pleiteada indenização de R$ 2.450,00 (aquisição de bens durante a viagem) + R$ 1.365,00 (empréstimo solicitado a
seu primo). Não houve dano moral. Réplica a fls. 133 e seguintes. Instados a especificarem provas, a ré pugnou pelo pronto
julgamento da lide, enquanto o autor juntou novos documentos. Manifestação da ré pugnando pelo desentranhamento dos
documentos acostados, eis que não se tratam de documentos novos e preclusa a oportunidade de realizar a juntada. Ademais
os documentos acostados não suprem a necessidade de apresentação de declaração de bens pessoais e não estão
acompanhados de tradução juramentada. É o relatório. Decido. JULGO ANTECIPADAMENTE o pedido, com fulcro no artigo
355, inciso I, do Código de Processo Civil, tendo em vista que a matéria em debate é exclusivamente de direito. I - DA RELAÇÃO
DE CONSUMO E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS Cumpre, inicialmente, observar que a relação jurídica entre as partes se
enquadra na definição de relação de consumo. Para que seja amparada pelo Código de Defesa do Consumidor, deve possuir
relação negocial, que visa a transação de produtos ou serviços, feita entre consumidor e fornecedor. Consumidor, como definido
pelo art. 2º do Código de Defesa do Consumidor, é toda a pessoa física ou jurídica que adquire um bem ou utiliza produtos ou
serviços como destinatário final. Por outro lado, fornecedor é aquele que desenvolve atividade de produção, montagem, criação,
exportação, distribuição ou comercializa produtos ou serviços, podendo ser qualquer pessoa física, jurídica, pública ou privada,
nacional ou estrangeira e até entes despersonalizados, nos termos do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor. Assim, a
relação jurídica entre o requerente e a requerida se enquadra perfeitamente nas condições de relação de consumo, pois entre
elas houve um nexo de causalidade, capaz de obrigar uma a entregar uma prestação à outra. Portanto, regem a relação material
o Código de Defesa do Consumidor. Conforme preceitua o artigo 6º, VIII, da Lei 8.078/90, impõe-se a inversão do ônus da
prova, dada a verossimilhança das alegações iniciais e ainda a hipossuficiência técnica e financeira do consumidor perante a ré.
Esclareço que, no que se refere a aplicação da Convenção de Varsóvia e Montreal, cumpre referir que, nos termos do Recurso
Especial nº 636.331/RJ, julgado sob repercussão geral Tema 210 firmou-se a seguinte tese: “(...) Nos termos do art. 178 da
Constituição da República, as normas e os tratados internacionais limitadores da responsabilidade das transportadoras aéreas
de passageiros, especialmente as Convenções de Varsóvia e Montreal, têm prevalência em relação ao Código de Defesa do
Consumidor (...)” Portanto, as referidas convenções são aplicadas a todo transporte internacional de pessoas, somente em
relação ao pedido de indenização por danos materiais. No caso em comento, houve a cumulação de pedidos de indenização por
danos materiais e extrapatrimoniais, de maneira que cabível a conciliação dos normas aplicáveis a cada uma das hipóteses. II
DOS DANOS MATERIAIS É fato incontroverso a existência do contrato de transporte estabelecido entre as partes e, que durante
a vigência, ocorreu o extravio definitivo da bagagem do autor, assim, como que, até o momento, o requerente não foi ressarcido
em quaisquer quantias. Nos contratos de transportes, o prestador de serviços, assume a obrigação de conduzir tanto o
passageiro, como sua bagagem com segurança. Nessa esteira, tendo a ré extraviado a bagagem do requerente, de rigor a
condenação ao ressarcimento do prejuízo causado. Quanto aos bens, inexiste qualquer razão para que não seja acolhida a
relação apresentada pelo autor. A lista trazida às fls. 38 é perfeitamente compatível com os itens levados em uma viagem de 27
dias para realização de um intercâmbio. Tratam-se de objetos e roupas comuns a viajantes. Ressalto que, não há que se falar
em comprovação de que tais pertences estariam na mala. Uma vez que incontroverso o extravio, mostra-se desarrazoada
exigência de que o autor apresente prova do conteúdo que estava em sua bagagem em relação aos itens de uso pessoal, em
especial diante da não abusividade da lista apresentada e ausência de impugnação específica aos demais itens listados.
Contudo, realmente não é possível acolher o pedido de ressarcimento em relação ao notebook e quantia em dinheiro, que
supostamente estariam no interior da mala despachada. É cediço que itens de valor devem ser levados na mala de mão do
viajante, não havendo como presumir que tais itens realmente estariam dentro da mala despachada, sendo que não consta dos
autos sequer nota fiscal que demonstrasse a compra do referido notebook. Nesse contexto, apenas será possível reconhecer o
direito ao ressarcimento em relação aos demais itens constantes da lista de fls. 38, no importe de R$ 4.018,00, quantia esta que
está dentro do limite indenizatório correspondente a 1000 Direitos Especiais de Saque, por passageiro, previsto art. 22.2 da
Convenção de Montreal. De fato, conforme consulta ao sítio eletrônico https://apps2.correios.com.br/efi/app/moeda/moeda.php,
realizada por mim nesta data às 10h04, cada DES corresponde a R$ 7,2302, de maneira que o limite indenizatório seria de R$
7.230,20. Os documentos que instruem a inicial, fls. 32/36, em tese, comprovariam que fora realizada um empréstimo em favor
do autor, no importe de 300 trezentos euros por pessoa que seria primo do requerente. Contudo, tal quantia pode ter sido
utilizada pelo requerente para qualquer finalidade e, ainda que se considere que os valores emprestados realmente cobriram os
gastos emergenciais do autor com a compra de novos itens para repor os itens extraviados, é certo que o ressarcimento dos
itens perdidos, já serve para saldar o valor do empréstimo suscitado. Em seguida, o autor afirma que teria sofrido danos com a
aquisição de itens de necessidade emergencial no importe de R$ 2.450,00 (dois mil, quatrocentos e cinquenta e cinco reais). É
inegável que o autor teve que arcar com despesas inesperadas para adquirir novos itens pessoais para se manter nos 27 dias
de seu intercâmbio. Ocorre que o autor não instruiu sua inicial com nenhum documento que possa comprovar minimamente os
gastos alegados, sendo certo que os itens perdidos serão ressarcidos, como já determinado, e os gastos com alimentação,
transporte, etc não se relacionam com o extravio da bagagem. Com efeito, os documentos juntados a fls. 165/174, não podem
ser considerados, posto que não se tratam de documentos novos e o autor não trouxe nenhuma justificativa válida para realizar
a juntada posterior, conforme determina o artigo 435, parágrafo único do CPC. Nesse contexto, a referida indenização pretendida
não poderá ser acolhida. III- DOS DANOS MORAIS O dano extrapatrimonial também restou caracterizado. É certo que o autor
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º