TJSP 02/05/2022 - Pág. 2017 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: segunda-feira, 2 de maio de 2022
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano XV - Edição 3496
2017
que indicou (p. 520/523 e 526/550), cuja autorização foi juntada pela requerida às págs. 553/563. É o relatório. FUNDAMENTO
e DECIDO. O feito comporta julgamento de plano, pois que não há necessidade de produção de prova em audiência (artigo 355,
inciso I, do Novo Código de Processo Civil). Pretende a autora compelir a requerida a arcar com os custos de seu tratamento
multidisciplinar, em razão do transtorno do espectro autista, em clínica especializada, por meio terapia ocupacional,
fonoaudiologia, fisioterapia, psicologia e nutricionista, sem limites de sessões. Ainda, pugnou que a requerida seja condenada a
reembolsar-lhe, de forma integral, os custos de tratamento realizado de forma particular, ante a prévia indisponibilidade de
profissionais qualificados. Por sua vez, a requerida negou cobertura ao tratamento, sob o fundamento de que não consta no rol
de procedimentos obrigatórios da ANS, e defendeu a legalidade da cláusula contratual que prevê a limitação do número de
sessões. Pois bem. De início, anota-se que o caso em tela comporta aplicação do Código de Defesa do Consumidor, por se
tratar de relação de consumo, já que a seguradora é prestadora de serviço e, por sua vez, é o contratante o seu usuário final.
Neste sentido, o Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo editou a Súmula 100, abaixo transcrita: O contrato de
plano/seguro saúde submete-se aos ditames do Código de Defesa do Consumidor e da Lei nº 9656/98 ainda que a avença
tenha sido celebrada antes da vigência desses diplomas legais. De igual forma, o C. Superior Tribunal de Justiça editou a
Súmula 469, assim redigida: Aplica-se o Código de Defesa do Consumidor aos contratos de plano de saúde. E, se é certo que o
Código de Defesa do Consumidor admite inversão do ônus da prova, não menos certo é que não o faz de forma indistinta. Pelo
contrário. A inversão do ônus da prova tem requisitos para ocorrer, a saber: quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação
ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias da experiência (art. 6º, VIII, da Lei nº 8078/90). Assim, o instituto
da inversão do ônus da prova existe para compensar ou suprir hipossuficiência do consumidor em face do fornecedor e não para
eximir o consumidor do ônus processual estabelecido pelo art. 333, do Código de Processo Civil. Somente se inverte o ônus da
prova quando o consumidor não tem meios de provar suas alegações, o que não ocorre neste caso concreto. Realmente, tem-se
que a autora não é hipossuficiente para fazer prova dos fatos alegados na inicial. Posta esta premissa, tem-se que restou
incontroverso e documentalmente comprovado nos autos que a autora, H.O.P., menor nascida em 26 de junho de 2017 (p. 27),
beneficiária do seguro saúde operado pela requerida (p. 40/41), foi diagnosticada como portadora de Transtorno do Espectro
Autista, motivo por que lhe foi indicado, por médico, tratamento multidisciplinar consistente em terapia ocupacional, com
integração sensorial, acompanhamento fonoaudiólogo com método bobath, fisioterapia com método pediasuit, psicologia com o
método aba e nutricionista especializada em seletividade alimentar, por tempo indeterminado (p. 37/39). Diz-se, pois, que a
autora provou os fatos constitutivos do seu direito. Já à requerida incumbia-lhe provar a existência de eventual cláusula
contratual que restringisse a cobertura da doença e/ou tratamento da parte autora, ônus do qual não se desincumbiu. Isto
porque limitou-se a afirmar que há um rol de procedimentos previsto pela ANS e em contrato e que os procedimentos pretendidos
pela autora não são reconhecidos como obrigatórios pela Agência Nacional de Saúde Suplementar. Neste ponto, observa-se
que as cláusulas contratuais devem ser interpretadas de modo mais favorável ao consumidor, especialmente quando se trata de
contrato de adesão, a teor do que preconiza o art. 47 do Código de Defesa do Consumidor. Ademais, a negativa sob o fundamento
de que o tratamento não é reconhecido como obrigatório pela ANS, afigura-se abusiva, nos termos do contido na Súmula 102 do
Tribunal de Justiça de São Paulo: Súmula 102: Havendo expressa indicação médica, é abusiva a negativa de cobertura de
custeio de tratamento sob o argumento da sua natureza experimental ou por não estar previsto no rol de procedimentos da ANS.
Nesse mesmo sentido: AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER PROPOSTA CONTRA OPERADORA DE PLANO DE SAÚDE.
BENEFICIÁRIO PORTADOR DE TRANSTORNO DO ESPECTRO AUTISTA. PRETENSÃO DE COBERTURA PARA TRATAMENTO
MULTIDISCIPLINAR PELO MÉTODO ABA. ABUSIVIDADE DA NEGATIVA DE COBERTURA. NECESSIDADE DAS TERAPIAS
PRESCRITAS PELO MÉDICO QUE ASSISTE O AUTOR. COBERTURA OBRIGATÓRIA, À LUZ DA SÚMULA 102 DESTE E.
TRIBUNAL. DANOS MORAIS. INOCORRÊNCIA. MERO DESCUMPRIMENTO CONTRATUAL INAPTO A ENSEJAR A
PRETENDIDA REPARAÇÃO PECUNIÁRIA. VALOR IMPOSTO A TÍTULO DE ASTREINTES QUE SE MOSTRA EXCESSIVO.
REDUÇÃO PARA R$ 10.000,00 (DEZ MIL REAIS), NOS TERMOS DO ARTIGO 537, §1º, INCISO I, DO NCPC. SENTENÇA
REFORMADA EM PARTE, MANTIDA A SUCUMBÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO (Apelação nº 103739170.2017.8.26.0100, Des. Rel.: Paulo Alcides, julgado em 08/04/2019). PLANO DE SAÚDE. PACIENTE COM TRANSTORNO DE
ESPECTROAUTISTA. FONOAUDIOLOGIA, TERAPIA OCUPACIONAL E COMPORTAMENTAL. MÉTODOS INTEGRAÇÃO
SENSORIAL E ABA. EXCLUSÃO. INADMISSIBILIDADE. SENTENÇA MANTIDA. 1.Sentença que julgou procedente ação
cominatória, para determinar que a ré forneça o tratamento solicitado, sem limite de sessões, na duração e quantidade
determinadas pelos especialistas, confirmando a tutela antecipada. 2. A recusa da ré à cobertura das terapias prescritas por
médico especialista que acompanha o paciente no tratamento, seja em decorrência de exclusão contratual, seja por não constar
na tabela da ANS, é inválida, violando a própria natureza do Contrato. 3. A interpretação das cláusulas contratuais deve ser feita
em prol do contratante beneficiário, a fim de garantir sua saúde (art. 47,do CDC), e em observância à própria função social do
Contrato. 4. Incidência da Súmula nº 102 do TJSP.5.Apelação não provida. (TJSP Apelação nº 1023467-81.2016.8.26.0114 - Rel
Alexandre Lazzarinni) Sendo assim, tem-se que não é dado à requerida garantir apenas os procedimentos listados no rol da
ANS, uma vez que a lista de procedimentos ostenta natureza de diretriz e constitui referência básica aos operadores de planos
de saúde na prestação dos serviços a que se propuseram, ou seja, não tem força para limitar direitos estipulados no contrato. A
propósito, ainda que excluída fosse a prestação de serviço de fonoaudiologia, psicologia e terapia ocupacional, tal exclusão
seria mitigada em hipótese de estar a providência ligada à doença objeto de cobertura. Tal exclusão caracterizar-se-ia como
cláusula abusiva, contrária ao direito do consumidor, pois inviabilizaria a realização do pleno tratamento e o escopo do próprio
contrato, qual seja, preservação da saúde do beneficiário do plano. Da mesma forma, não tem lugar eventual limitação quanto
ao número de sessões indicadas pelo profissional médico, pois igualmente se mostra abusiva, observado que deve prevalecer a
prescrição médica para o caso específico do paciente. Sobre o assunto, cita-se jurisprudência do E. Tribunal de Justiça de São
Paulo: PLANO DE SAÚDE. Ação de obrigação de fazer. Autor portador de “Transtorno do Espectro Autista”. Indicação de terapia
multidisciplinar pelo “Método ABA” (fonoaudiologia, terapia ocupacional com integração sensorial, psicologia e musicoterapia).
Negativa de cobertura sob o fundamento de ausência de previsão no rol de procedimentos da ANS. Recusa indevida. Abusividade
nos termos dos arts. 14 e 51, IV e § 1º do CDC. Incidência da Súmula nº 102 do TJSP. Impossibilidade de limitação do número
de sessões de terapia e, consequentemente, de cobrança de coparticipação sobre o excedente. Precedentes. Elevação dos
honorários advocatícios em sede recursal. Sentença mantida. RECURDO DESPROVIDO (Apelação nº 104538263.2018.8.26.0100 Des. Rel.: ALEXANDRE MARCONDES julgado em 31/01/2019). PLANO DE SAÚDE. OBRIGAÇÃO DE
FAZER. Autora diagnosticada com Transtorno do Espectro Autista. Prescrição médica para tratamento multidisciplinar com o
método ABA. Negativa de cobertura, sob alegação de que não consta no rol da ANS. Abusividade. Aplicação da Súmula nº 102
do TJSP. Expressa indicação médica. Tratamento indispensável para o bom desenvolvimento da paciente, e que não pode ser
comparado a tratamento educativo. Não cabimento da limitação de cobertura. Precedentes. Sentença mantida. Honorários
advocatícios majorados. Recurso não provido, com observação (Apelação nº 1010335-22.2018.8.26.0005, Des. Rel.: Fernanda
Gomes Camacho, julgado em 08/04/2019). Logo, não pode a autora, para quem houve a prescrição de tratamento pelo médico
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