TRF3 29/01/2019 - Pág. 677 - Publicações Judiciais I - Tribunal Regional Federal 3ª Região
PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE. INSURGÊNCIA DA ACUSAÇÃO. RECURSO PROVIDO.
1. Autoria e materialidade delitivas incontestes e suficientemente comprovadas nos autos.
2. O juízo da origem condenou a ré pela prática do delito previsto no artigo 33, caput c/c o artigo 40, I, ambos da Lei nº 11.343/2006.
Ao aplicar a sanção, fixou pena privativa de liberdade nos moldes do sistema trifásico, quantum este que não foi objeto de insurgência
pelo órgão acusatório, porquanto ainda consoante ditames legais e jurisprudenciais pertinentes.
3. A imposição da pena de multa, todavia, restou afastada. Entendeu o magistrado sentenciante que a impossibilidade de a ré arcar com o
pagamento da pena de multa, dada a sua hipossuficiência econômica, poderia implicar na inviabilidade de sua transferência para cumprir a
pena em seu país de origem - conforme previsão do tratado celebrado entre os governos brasileiro e boliviano, promulgado mediante
Decreto nº 6.128/2007 - consubstanciando assim medida desproporcional.
4. Referido tratado, resultante de acordo entre os governos brasileiro e boliviano, versa sobre a possibilidade de que condenados à pena
privativa de liberdade a cumpram no país de sua nacionalidade, desde que cumpridas determinadas condições. Trata-se, portanto, de
possibilidade - diversamente de uma determinação - para que se proceda na forma do tratado, uma vez verificada a satisfação de um
elenco de requisitos. Dentre os requisitos, há a exigência expressa de que o condenado tenha adimplido eventuais condenações
pecuniárias impostas nos termos da sentença condenatória, ou que garanta seu pagamento de forma satisfatória ao Estado remetente,
conforme artigo IV do referido tratado. Conclui-se, dos requisitos previstos para que se proceda na forma prevista pelo tratado, que
houve por bem que se considerasse o interesse estatal envolvido no adimplemento das eventuais condenações em pecúnia impostas ao
sentenciado para que este pudesse valer-se da possibilidade de cumprir a pena privativa de liberdade em seu país de origem.
5. A pena de multa decorre de disposição expressa de lei e constitui sanção obrigatória cumulativa, sendo inviável o afastamento de sua
imposição em função do alegado estado de hipossuficiência econômica do condenado. Tal posição é assente na jurisprudência.
Precedente do STJ, aduzindo que "Esta Corte Superior firmou o entendimento de que não é viável a isenção da pena de multa
imposta ao acusado, sob o argumento de que não teria condições econômico-financeiras de efetuar o seu pagamento, uma vez
que tal pleito não possui previsão no ordenamento jurídico" (HC - HABEAS CORPUS - 295958 2014.01.30479-0, RIBEIRO
DANTAS, STJ - QUINTA TURMA, DJE DATA:03/08/2016); desta Corte, " a pena de multa decorre do preceito secundário do
artigo 33 da Lei de Drogas e da previsão legal do artigo 32, III, do Código Penal e incide obrigatoriamente em cumulação com a
pena privativa de liberdade, independente da condição de hipossuficiência do réu e é compatível com o delito praticado e com a
pena privativa aplicada. ...."(ACR - APELAÇÃO CRIMINAL - 53669 0001652-80.2011.4.03.6003, DESEMBARGADOR
FEDERAL VALDECI DOS SANTOS, TRF3 - PRIMEIRA TURMA, e-DJF3 Judicial 1 DATA:17/02/2017);dentre outros julgados.
6. O artigo 33 da Lei nº 11.343/2006 comunica opção de política criminal do legislador que, observando as características inerentes ao
delito do tráfico ilícito de entorpecentes, cometido quase que exclusivamente pela ganância e busca do lucro fácil, recrudesceu os
parâmetros da pena de multa com vistas a ensejar punição mais rigorosa, devendo as questões referentes à eventual impossibilidade
concreta de cumprimento serem discutidas perante o Juízo das Execuções.
7. Sendo assim, as disposições do tratado aludido não derrogaram a obrigatoriedade da imposição da pena de multa contida no preceito
secundário do tipo do artigo 33, caput da Lei nº 11.343/2006, subsistindo o interesse na imposição daquela sanção ao condenado. É
defeso ao magistrado, pois, a pretexto de garantir em abstrato a aplicabilidade do tratado em referência, arrogar-se o direito de afastar, à
margem de previsão legal, a imposição de sanção prevista pelo legislador.
8. Sentença reformada para que a ré, condenada pela prática do delito do artigo 33, caput c/c o artigo 40, I da Lei nº 11.343/2006 seja
apenada com a pena de multa, além da pena de reclusão já imposta na origem.
9. Pena de multa aplicada nos moldes do sistema bifásico, restando fixada em 291 dias-multa, e o valor de cada dia-multa estabelecido no
mínimo legal previsto, qual seja, de 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente quando dos fatos.
10. Recurso provido.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, decide a Egrégia Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª
Região, por unanimidade, dar provimento ao recurso de apelação do Ministério Público Federal para impor pena de multa à condenada,
prevista no preceito secundário do artigo 33 da Lei nº 11.343/2006, fixando-a no valor de 291 (duzentos e noventa e um) dias-multa,
cada qual estabelecido em 1/30 (um trigésimo) do salário mínimo vigente quando dos fatos, mantida, no mais, a r. sentença, nos termos do
relatório e voto que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
São Paulo, 21 de janeiro de 2019.
SILVIO GEMAQUE
Juiz Federal Convocado
00005 APELAÇÃO CRIMINAL Nº 0006027-80.2008.4.03.6181/SP
2008.61.81.006027-9/SP
RELATOR
APELANTE
ADVOGADO
: Desembargador Federal PAULO FONTES
: NELSON MANUEL CASTRO PAVEZ
: SP303035 MIRELLA MARIE KUDO (Int.Pessoal)
: SP0000DPU DEFENSORIA PUBLICA DA UNIAO (Int.Pessoal)
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 29/01/2019
677/1695