TJAC 06/06/2022 - Pág. 135 - Diário da Justiça - Tribunal de Justiça do Estado do Acre
Rio Branco-AC, segunda-feira
6 de junho de 2022.
ANO XXVIlI Nº 7.079
DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO
princípio da legalidade estrita, não podendo o gestor praticar atos que a lei não
autoriza, sob pena de invalidação.
7. A propósito desse assunto, a doutrina de José dos Santos Carvalho Filho,
em sua obra: Manual de Direito Administrativo, rev. amp. e atual. 28ª ed. São
Paulo: 2015, Editora Atlas, p. 20, leciona que:
“O princípio da legalidade é certamente a diretriz básica da conduta dos agentes da Administração. Significa que toda e qualquer atividade administrativa
deve ser autorizada por lei. Não o sendo, a atividade é ilícita”.
8. Conforme já anotado, está-se diante de pedido de (re)análise do Aditivo ao
Termo de Adesão n. 08/2019, firmado entre o Tribunal de Justiça do Acre e a
colaboradora/conciliadora Clarice Ferreira de Souza, que atua junto à Comarca de Sena Madureira, no que atine, sobreduto, à regularidade da prorrogação.
9. Pois bem. Precedendo a qualquer colocação, realça-se que toda atuação
administrativa resta abrangida pelo princípio da autotutela (corolário da legalidade), o qual confere ao administrador público oportunidade de revisitar
os seus atos, para anulá-los (se ilegais) ou revogá-los (se inoportunos, respeitados os direitos adquiridos). Calha, pois, a doutrina de MOREIRA NETO
(MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo: parte
introdutória, parte geral e parte especial. Rio de Janeiro: Forense, 2005), no
ponto destacado quanto à autotutela:
[...]
exprime o duplo dever da Administração Pública de controlar seus próprios
atos quanto à juridicidade e à adequação ao interesse público, o que corresponde ao controle, a seu cargo, de legalidade, de legitimidade e de licitude,
que são vinculados, e ao controle de mérito, que é discricionário. [...] A Administração Pública, como expressão do poder estatal, no uso de seus poderes,
tanto pode anular seus próprios atos no exercício do controle interno de legalidade, de legitimidade e de moralidade, quanto os pode revogar, avaliando-lhes
a oportunidade e a conveniência.
10. Ante a relevância da autotutela no âmbito do Direito Administrativo, foi ela
corporificada pelo E Supremo Tribunal, na Súmula 473, cuja dicção reproduz-se:
Súmula 473. A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados
de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos
adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.
11. Dito isso, veja-se que o instrumento posto à apreciação da Presidência
trata-se de contrato firmado entre particular (pessoa física) e a Administração,
eis porque faz-se importante assinalar que o art. 22, inciso XXVII da CF estabelece competir privativamente à União legislar sobre normas gerais de contratação, em todas as modalidades, para as Administrações Públicas Diretas
ou Indiretas, sempre em observância ao que estabelece o art. 37, caput da CF.
Reproduzo os dispositivos:
Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre:
XXVII - normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades,
para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União,
Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI,
e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do
art. 173, § 1°, III;
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e,
também, ao seguinte:
12. Ocorre que em se tratando o dispositivo em referência (art. 22, da CF)
de norma constitucional com eficácia limitada, fora editada a Lei Federal n.
8.666/93 (Lei de Licitações), que instituiu as normais gerias de contratação a
serem seguidas pela Administração Pública. Nesse viés, veja o que prevê a lei
sobre a “execução dos contratos”, ipsis litteris.
Art. 66. O contrato deverá ser executado fielmente pelas partes, de acordo
com as cláusulas avençadas e as normas desta Lei, respondendo cada uma
pelas conseqüências de sua inexecução total ou parcial.
13. Avançando, tem-se que o contrato administrativo em questão (em verdade,
Aditivo ao Termo de Adesão n. 08/2019 - id 1015046) caracteriza-se, in casu,
pelo acordo de vontades entre um particular (conciliadora) e a Administração,
representada no ato pelo Tribunal de Justiça do Acre, submetido, portanto, ao
regime jurídico de Direito Público e, por isso, instruído pelos princípios publicísticos. No ponto, convém citar in litteris, o que dispõe o art. 54 da lei 8.666/93:
Art. 54. Os contratos administrativos de que trata esta Lei regulam-se pelas
135
suas cláusulas e pelos preceitos de direito público, aplicando-se-lhes, supletivamente, os princípios da teoria geral dos contratos e as disposições de direito
privado.
14. Justamente por se tratar de avença firmada na esfera do Direito Público deve, necessariamente, cumprir uma série de requisitos/exigências (tanto
formais, quanto de conteúdo), que são aqueles comumente impostos à Administração como um todo, conditio sine qua non para sua própria legalidade/
validade.
15. Do mesmo modo, tal qual ocorre com a celebração do ajuste, a prorrogação do contrato administrativo também é ato bilateral, de natureza convencional, e deve observar os mesmos requisitos/exigências legais impostos no início
do acordo. Portanto, para a sua realização deve haver, impreterivelmente, a
manifestação de ambas as partes (contratante e contratado), em convergência
de vontades, não sendo possível, regra geral, a imposição de uma delas.
16. No mais, sobre a prorrogação de contrato firmado com a Administração
Pública (repito, que é o objeto dos presentes autos), importante que se diga
tratar-se de mera expectativa de direito do contratado, dado que a repactuação
do termo está inserida (para além da análise da legalidade) no âmbito de discricionariedade da Administração; ou seja, o gestor sopesará sobre sua conveniência e oportunidade, caso a caso, antes de exprimir a vontade administrativa.
17. Não somente isso. Afora o controle interno realizado pela própria Administração, todo contrato administrativo também está sujeito a controle externo
exercido pelos Tribunais de Contas, no que toca à legalidade, legitimidade,
economicidade, aplicação das subvenções e renúncia de receitas, ex vi dos
arts. 70 e 71, ambos da CF. Tal controle não é prévio, mas posterior à celebração do ajuste, conforme inclusive já sumulou o Tribunal de Contas da União
– TCU. Reproduzo, nesse toar, o teor dos artigos em espeque e o enunciado
sumular n. 78, do TCU, respectivamente:
Art. 70. A fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial da União e das entidades da administração direta e indireta, quanto à
legalidade, legitimidade, economicidade, aplicação das subvenções e renúncia
de receitas, será exercida pelo Congresso Nacional, mediante controle externo, e pelo sistema de controle interno de cada Poder.
Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com
o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete:
SÚMULA Nº 078, TCU. Com o sistema de controle externo, instituído pela
Constituição de 1967 e disciplinado em legislação ordinária pertinente, não
compete ao Tribunal de Contas da União julgar ou aprovar previamente contratos, convênios, acordos ou ajustes celebrados pela Administração Pública.
Pode, todavia, o Tribunal, no exercício da auditoria financeira e orçamentária e
com vistas ao julgamento das contas de responsáveis ou entidades sob a sua
jurisdição, tomar conhecimento dos respectivos termos, para, se verificar ilegalidade ou irregularidade, adotar providências no sentido de saná-la ou evitar
a sua reincidência.
18. Pois bem. Fixadas essas premissas e volvendo à hipótese telada, veja-se,
em observância ao teor do Termo de Adesão n. 08/2019 (contrato inicial objeto
dos autos SEI n. 0101791-80.2015.8.01.0000 - id 0618603), assinado em 01
de julho de 2019, o que dispõe a cláusula quarta, no tocante à “vigência” do
ajuste, in verbis:
CLÁUSULA QUARTA – DA VIGÊNCIA
I - O presente Termo terá vigência de 02 (dois) anos, contados a partir da data
da assinatura, podendo ser prorrogado por interesse das partes por igual período, mediante termo aditivo.
19. Sem maiores delongas, da leitura da avença extrai-se que o Termo de
Adesão n. 08/2019 teve sua vigência encerrada em 01 de julho de 2021; por
sua vez, a renovação do contrato fora assinada em 30 de julho de 2021, com
efeitos retroativos a 01 de julho de 2021. Surge, então, a questão: é possível
a prorrogação contratual após o encerramento de sua vigência, ainda que com
efeitos retroativos?
20. Em resposta, digo que nos moldes do já decidido pelos órgãos constitucionalmente responsáveis pelo controle externo dos contratos administrativos
(Tribunais de Contas), a regularidade/legalidade da prorrogação de ajuste firmado entre a Administração Pública e o particular imprescinde da comprovação de formalização tempestiva, ou seja, que a prorrogação da avença se dê
durante a vigência contratual. Trago à ilação a seguinte decisão ilustrativa que,
mutatis mutandis, reforça a tese aqui esposada:
RECURSO ORDINÁRIO. PRESENÇA DOS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE. CONHECIMENTO DECISÃO. SIMPLES FORMALIZAÇÃO DO 2º
TERMO ADITIVO FORA DO PRAZO. IRREGULARIDADE. INFRAÇÃO. MULTA. ALEGAÇÕES RECURSAIS. PROROGAÇÃO DO PRAZO DE VIGÊNCIA