TJBA 11/02/2022 - Pág. 2023 - CADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.038 - Disponibilização: sexta-feira, 11 de fevereiro de 2022
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Diante da análise dos elementos de informação encerrados nos autos, percebo que a controvérsia gravita em torno da legalidade da cobrança
de anuidade de cartão de crédito vinculado a estabelecimento comercial, cuja cobrança, supostamente, não foi informada de modo prévio e
nem autorizada pelo consumidor.
Ab initio, cumpre observar que a matéria já se encontra sedimentada amplamente no âmbito desta 6ª Turma Recursal, como pode se verificar
dos precedentes solidificados quando do julgamento dos seguintes processos: 8000457-95.2020.8.05.0189; 8001587-57.2019.8.05.0189
Entendo que a insurgência da Recorrente não merece prosperar, como veremos a seguir.
Sobre o tema (anuidade, inclusive de cartões para uso restrito à mesma rede), em atenção à RESOLUÇÃO de n. 3.919, datada de 25/11/2010,
emitida pelo BANCO CENTRAL, é possível a cobrança de anuidade no cartão de crédito, desde que informada/explicitada ao cliente de
forma prévia.
“Art. 1º A cobrança de remuneração pela prestação de serviços por parte das instituições financeiras e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil, conceituada como tarifa para fins desta resolução, deve estar prevista no contrato firmado entre a instituição e o cliente ou ter sido o respectivo serviço previamente autorizado ou solicitado pelo cliente ou pelo usuário.
(...) Art. 5º Admite-se a cobrança de tarifa pela prestação de serviços diferenciados a pessoas naturais, desde que explicitadas ao cliente ou ao
usuário as condições de utilização e de pagamento, assim considerados aqueles relativos a:
IX - cartão de crédito diferenciado;
(...) Art. 11. Com relação ao cartão de crédito diferenciado, previsto no art. 5º, inciso IX:
I - admite-se a cobrança apenas de tarifa de anuidade diferenciada, que deve englobar a disponibilização e utilização de rede de estabelecimentos afiliados, instalada no País e/ou no exterior, para pagamentos de bens e serviços, bem como a disponibilização e gerenciamento de
programas de benefícios e/ou recompensas vinculados ao cartão, sendo obrigatória a utilização da denominação “Anuidade cartão diferenciado” e da sigla “Anuidade Diferenciada”.
O código do consumidor também prevê a exigência prévia ao consumidor nos seus arts. 6º, III e 46, in verbis:
Art. 6º. São direitos básicos do consumidor:
(...) III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem;
Art. 46. Os contratos que regulam as relações de consumo não obrigarão os consumidores, se não lhes for dada a oportunidade de tomar
conhecimento prévio de seu conteúdo, ou se os respectivos instrumentos forem redigidos de modo a dificultar a compreensão de seu sentido
e alcance.
No caso em tela, caberia à parte ré provar que, de fato, a parte autora celebrou o contrato que previa a cobrança de anuidades de cartão de
crédito, o que não ocorreu, tendo em vista que não há comprovação nos autos do consentimento livre do consumidor e conhecimento prévio
do conteúdo do contrato que ensejou as aludidas cobranças, portanto não cumpriu o seu dever de informação e transparência, conforme o
disposto nos artigos 6º, inciso III e 46, ambos do CDC.
A conduta da parte ré revela-se abusiva, na medida que impôs a parte Autora o pagamento de tarifa de anuidade de cartão de crédito sem seu
consentimento.
Assim, no tocante a repetição do indébito, mantenho a devolução na forma dobrada, conforme consignado em sentença, visto que caracterizada a cobrança indevida, tem direito a parte Acionante a repetição, em dobro, do que pagou em excesso, nos termos do art. 42, parágrafo único,
do CDC. In verbis:
Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.
Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em
excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.
Em relação aos danos morais, in casu, entendo que a condenação deriva da ilicitude cometida pela parte ré, notadamente pela cobrança de
tarifa não contratada pelo consumidor.
No tocante o quantum indenizatório, o Juiz deve observar aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, não se afastando, ainda, do
caráter punitivo-pedagógico da condenação, considerando a capacidade econômica das partes, a gravidade, natureza e repercussão da ofensa,
o grau do dolo ou da culpa do responsável, de forma que a sua fixação sirva para desestimular à conduta lesiva do Acionado, e ao mesmo
tempo, não gere enriquecimento sem causa ao consumidor.
No caso em comento, entendo que a indenização fixada pelo Juízo a quo atende aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, reparando com coerência os danos efetivamente sofridos, por defeito relativo na prestação de serviço sem, contudo, propiciar enriquecimento sem
causa, razão pela qual merece ser mantida em sua integralidade.
Neste sentido ainda é o entendimento das Turmas Recursais dos Juizados Especiais da Bahia, in verbis:
Tribunal de Justiça do Estado da Bahia PODER JUDICIÁRIO QUINTA TURMA RECURSAL - PROJUDI PADRE CASIMIRO QUIROGA,
LT. RIO DAS PEDRAS, QD 01, SALVADOR - BA [email protected] - Tel.: 71 3372-7460 5ª TURMA RECURSAL DOS JUIZADOS ESPECIAIS DO ESTADO DA BAHIA PROCESSO: 0035525-21.2019.8.05.0080 CLASSE: RECURSO INOMINADO RECORRENTE: GESIANE ALVES DE ARAUJO RECORRIDO: CENCOSUD BRASIL COMERCIAL LTDA JUIZPROLATOR: ANNA RUTH NUNES
MENEZES BISPO RELATOR: ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA EMENTA RECURSO INOMINADO. CONDIÇÕES DE ADMISSIBILIDADE PREENCHIDAS. DIREITO DO CONSUMIDOR. COBRANÇA DE ANUIDADE DE CARTÃO DE CRÉDITO SEM ANUÊNCIA
DA PARTE AUTORA. PARTE ACIONADA QUE NÃO JUNTOU AOS AUTOS CONTRATO DEVIDAMENTE ASSINADO PELA PARTE
AUTORA CAPAZ DE SUSTENTAR A LEGITIMIDADE DA COBRANÇA. FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SENTENÇA REFORMADA PARA CONDENAR A PARTE RÉ ME DANOS MORAIS NO VALOR DE R$ 3.000,00 (TRÊS
MIL REAIS), BEM COMO DETERMINAR A RESTITUIÇÃO EM DOBRO DOS VALORES INDEVIDAMENTE COBRADOS. RECURSO
CONHECIDO E PROVIDO. (...) Salvador, Sala das Sessões, em 24 de fevereiro de 2021. ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA Relatoria
e Presidência(TJ-BA - RI: 00355252120198050080, Relator: ROSALVO AUGUSTO VIEIRA DA SILVA, QUINTA TURMA RECURSAL, Data
de Publicação: 24/02/2021)
Assim, verifico que o juízo a quo avaliou com cuidado as provas carreadas aos autos, de modo que a sentença não demanda reparos.
Diante do exposto, e por tudo mais constante nos presentes autos, hei por bem CONHECER E NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO,
interposto, mantendo íntegra a sentença proferida.