TJBA 14/03/2022 - Pág. 2015 - CADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.056 - Disponibilização: segunda-feira, 14 de março de 2022
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Há de se ratificar que o aspecto ético e moral da conduta do policial militar pode ser avaliado no âmbito da Administração, mesmo
diante da prática de crimes, que também configura-se como transgressão disciplinar, em razão do princípio da independência entre as instâncias administrativa e penal, tal como evidencia o art. 2º, da CF/88, in verbis: “São Poderes da União, independentes
e harmônicos entre si, o Legislativo, o Executivo e o Judiciário”. Nesse mesmo sentido o entendimento expresso pelo Supremo
Tribunal Federal, in verbis:
A punição administrativa ou disciplinar não depende de processo civil ou criminal a que se sujeite também o servidor pela mesma
falta, nem obriga a Administração a aguardar o desfecho dos demais processos (STF, RDA 35/148; TFR, RDA 35/146)”;
“A punição interna, autônoma que é, pode ser aplicada ao servidor antes do julgamento judicial do mesmo fato.” (STF, RT
227/586, 302/747).
Vale salientar a prevalência do princípio da independência das instâncias penal, administrativa e civil nos termos do art. 50, §§
2º, 3º e 4º, da Lei 7.990/2001:
Art. 50 O policial militar responde civil, penal e administrativamente pelo exercício irregular de suas atribuições.
(...)
§2º. A responsabilidade penal abrange os crimes militares, bem como os crimes de competência da Justiça comum e as contravenções imputados ao policial militar nessa qualidade.
§3º. A responsabilidade administrativa resulta de ato omissivo ou comissivo, praticado no desempenho de cargo ou função capaz
de configurar, à luz da legislação própria, transgressão disciplinar.
§4º. A responsabilidade civil, penal e administrativa poderão cumular-se, sendo independentes entre si.
(...)
Nesse sentido, está a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça. Veja-se:
MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. AUDITORA FISCAL DO TRABALHO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. CONHECIMENTO DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. INSTAURAÇÃO DO PAD. CAUSA INTERRUPTIVA. FLUÊNCIA APÓS 140 DIAS. PRESCRIÇÃO AFASTADA MESMO QUE CONSIDERADO O PRAZO QUINQUENAL. INFRAÇÕES DISCIPLINARES TIPIFICADAS COMO CRIME. INCIDÊNCIA DO ART. 142, § 2º, DA LEI 8.112/90. INDEPENDÊNCIA
DAS INSTÂNCIAS PENAL E ADMINISTRATIVA. VINCULAÇÃO APENAS NO CASO DE SENTENÇA PENAL ABSOLUTÓRIA
COM BASE EM PROVA DA INEXISTÊNCIA DO CRIME OU DA NEGATIVA DE AUTORIA. UTILIZAÇÃO DE PROVA EMPRESTADA DA SEARA CRIMINAL. POSSIBILIDADE. PEDIDO DE EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS SEM INDÍCIOS DE RECUSA DA
AUTORIDADE ADMINISTRATIVA. INVIABILIDADE. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. PRECARIEDADE DA PROVA
PRÉCONSTITUÍDA. ORDEM DENEGADA. (...) 4. As instâncias penal e administrativa são independentes, sendo que a única
vinculação admitida ocorre quando, na seara criminal, restar provada a inexistência do fato ou a negativa de autoria. Hipótese em
que a impetrante figura como acusada em ação penal pela prática dos crimes de corrupção passiva e quadrilha. Precedentes. (...)
8. Segurança denegada. (MS 17.954/DF, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/02/2014,
DJe 19/03/2014).
Noutro giro, diante do quadro probatório, a autoridade administrativa decidiu por aplicar a sanção disciplinar de demissão em consonância com a norma estadual por configurar a conduta do Autor incompatível com os preceitos éticos da Corporação Militar. O
inciso II, alínea “a” do art. 57 c/c art. 193 da Lei Estadual 7.990/2001, Estatuto dos Policiais Militares do Estado da Bahia. Veja-se:
Art. 193 - A demissão será aplicada como sanção aos policiais militares de carreira, após a instauração de processo administrativo em que seja assegurada a ampla defesa e o contraditório nos seguintes casos: I. incursão numa das situações constantes
do art. 57 desta Lei;
Art. 57 - A pena de demissão, observada as disposições do art. 53 desta Lei, será aplicada nos seguintes casos: ... II - a consumação ou tentativa como autor, co-autor ou partícipe em crimes que o incompatibilizem com o serviço policial militar, especialmente
os tipificados como: a) de homicídio (art. 121 do Código Penal Brasileiro);
Ainda que não seja permitido adentrar-se ao mérito administrativo, ao se compulsar os autos, observa-se que existem fortes indícios e elementos de provas suficientes a revelar como violadoras as posturas funcionais que se buscou apurar, não tendo sido
verificados excessos ou nulidade junto a edição do ato punitivo.
Observa-se também que a instrução processual foi preservada em face das garantias individuais vigentes, tendo sido oportunizado ao Impetrante defender-se das acusações que lhes recaíram, estando o Impetrante devidamente assistido pelo defensor
que preferiu constituir.
Nesse prisma, saliente-se, como aos juízes com todo o rigor do processo judicial, aplica-se a faculdade de valoração das provas,
mais ainda ao julgador no plano administrativo, cujo processo é marcado pelo formalismo moderado. Assim, os dados constantes nos referidos autos permitem à autoridade administrativa a precisa avaliação das transgressões estatutárias denunciadas à
época dos fatos.
Em sendo assim, percebo que houve coerente exposição dos fatos e situações que motivaram a instauração do feito disciplinar,
bem como o decisum administrativo a que se chegou (solução administrativa ID. 107805991-publicado em 29/01/2021). A proporcionalidade encontra-se na esfera de decisão da própria autoridade administrativa, em respeito à independência dos poderes
e aos critérios de oportunidade e conveniência.
No caso em tela, não há irregularidades que justifiquem a expedição de decreto anulatório, posto que os aspectos que devem
ser analisados pelo Judiciário, frente à possibilidade de anulação dos atos administrativos, foram coerentemente fundamentados;