TJBA 08/09/2022 - Pág. 2006 - CADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.173 - Disponibilização: quinta-feira, 8 de setembro de 2022
Cad 2/ Página 2006
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda
que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando
a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
A regra geral trazida no ordenamento jurídico (art. 927, caput) é a responsabilidade subjetiva, a qual depende da comprovação
da atuação culposa do autor do dano. Contudo, o parágrafo único do art. 927 estabelece as hipóteses em que haverá a responsabilidade civil objetiva, sendo prescindível a análise do elemento subjetivo culpa.
O Código de Defesa do Consumidor erigiu como regra geral a responsabilidade objetiva dos fornecedores de produtos ou serviços. Assim, estabelecida a subsunção do caso dos autos ao diploma consumerista, tem-se a responsabilidade da parte acionada
independer da comprovação da sua atuação culposa.
Ainda assim, exige-se a demonstração dos elementos caracterizadores do dever de indenizar, quais sejam: a conduta lesiva; o
dano; e o nexo causal. Vejamos.
No caso sub judice, verifica-se inexistir afirmação específica acerca da data em que foi formulado o requerimento de cancelamento do pacote (fl. 03 do ID 80424525), tampouco se identifica qualquer demonstração documental de pedido administrativo.
Também não consta na exordial alegação de que o reembolso foi negado ou condicionado ao pagamento de multa contratual.
Por fim, a Autora não chegou a sustentar o descumprimento do prazo estabelecido pela parte ré, para promover a devolução dos
valores, presumindo-se que esta foi realizada.
Dessa forma, constata-se que não houve ato ilícito perpetrado pelas Acionadas. A própria Demandante admite que a impossibilidade de realização da viagem na data originalmente pactuada deu-se em razão de enfermidade a que foi acometida, não
havendo responsabilidade das Rés por tal fato. Embora tenha afirmado que a “iminência da pandemia” (fl. 02 do ID 80424525)
tenha contribuído para o cancelamento da viagem, esta alegação não merece prosperar, pois, como se sabe, a situação de calamidade pública decorrente do vírus da COVID-19 apenas passou a existir em março de 2020, três meses após a data prevista
para viagem da Autora.
Além disso, após tentativas de redesignação, a própria consumidora buscou em sede administrativa o cancelamento do contrato,
a que não houve objeção da parte ré. Desta forma, inexistindo alegação de que as Demandadas deixaram de promover o reembolso dos valores adimplidos pela consumidora, não há que se falar em ato ilícito, afastando-se o dever de indenizar.
Noutro giro, também não se faz possível reconhecer a abusividade do prazo estabelecido pela parte ré para a devolução dos
valores, o qual foi fixado de forma razoável, de acordo com os trâmites envolvidos na operação.
Do que foi dito, colho entendimento jurisprudencial:
CONSUMIDOR. COMPRA VIA INTERNET - DESISTÊNCIA NO PRAZO LEGAL - DEVOLUÇÃO DO VALOR DENTRO DE PRAZO RAZOÁVEL - INEXISTÊNCIA DE ATO ILÍCITO. DANO MORAL NÃO CARACTERIZADO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Presentes os requisitos, defiro ao autor e recorrente a gratuidade de justiça. 2. O consumidor pode desistir de
compra realizada via internet no prazo de 7 dias, contado do recebimento do produto, e valores eventualmente pagos deverão
ser devolvidos, nos termos do art. 49 do CDC. 3. Na origem, o autor alegou que efetuou a compra de três celulares, mas resolveu
cancelar a compra diante de promoção constatada a posteriori. Os produtos foram enviados mesmo com o pedido de cancelamento e o estorno só seria efetivado depois de retornarem ao centro de distribuição da empresa. Salientou que em decorrência
da falha na prestação de serviço enfrentou inúmeros problemas em sua viagem ao Rio de Janeiro por ter o limite de seu cartão
comprometido. Requereu o cancelamento e estorno do pedido; a repetição de indébito na forma dobrada; e a indenização em
danos morais. A sentença julgou improcedentes os pedidos ao argumento de que não houve falha na prestação do serviço, já
que o cancelamento da compra foi realizado e o valor devolvido dentro de prazo razoável. 4. É incontroverso que o autor efetuou a compra em 29/11/2019 (ID 18188991 - pág. 2), uma sexta-feira, e solicitou o cancelamento via e-mail no mesmo dia às
21h10min e entrou em contato na segunda-feira por telefone. Na terça-feira seguinte recebeu e-mail informando que os produtos
tinham sido enviados e por telefone a atendente esclareceu que o estorno só seria possível depois do retorno dos produtos ao
centro de distribuição. A compra foi realizada via cartão de crédito em doze vezes, cuja primeira parcela de R$ 134,03 foi paga
na fatura com vencimento em 25/12/2019 (ID 18188996 - pág. 2) e na de janeiro houve a cobrança da segunda parcela de R$
134,08 e o estorno de R$ 268,11 (ID 18189412 - pág. 3). 5. Assim, o cancelamento da compra e o estorno dos valores já foram
realizados, não restando caracterizada falha na prestação de serviço, tendo a devolução sido feita logo na fatura subsequente,
ou seja, dentro de prazo razoável. Por conseguinte, como não houve ato ilícito, fica prejudicada a análise do dano moral. A confirmação da sentença, portanto, é medida que se impõe. 6. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 7. Sentença mantida por
seus próprios e jurídicos fundamentos, com súmula de julgamento servindo de acórdão, na forma do art. 46 da Lei nº 9.099/95.
8. Em razão da sucumbência, condeno o recorrente ao pagamento das custas processuais e dos honorários advocatícios que
fixo em R$500,00 (quinhentos reais), nos termos do art. 85, § 8º, do CPC, ficando suspensa a exigibilidade em razão da gratuidade de justiça. (TJ-DF 07000853320208070014 DF 0700085-33.2020.8.07.0014, Relator: ASIEL HENRIQUE DE SOUSA, Data
de Julgamento: 17/09/2020, Terceira Turma Recursal, Data de Publicação: Publicado no DJE : 05/10/2020 . Pág.: Sem Página
Cadastrada.) (grifamos).
DO DISPOSITIVO
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO, extinguindo o feito com resolução de mérito, a teor do art. 487, inciso I,
do Código de Processo Civil.
Condeno a parte autora ao pagamento das custas processuais, arbitrando os honorários advocatícios em 10% (dez por cento)
sobre o valor da causa, devendo-se atentar à suspensão de exigibilidade de tais valores, na forma e pelo prazo trazidos no art.
98, § 3º, do CPC, ante a gratuidade de justiça já concedida em seu favor (ID 104157549).
Publique-se. Intimem-se.
Salvador/BA, data registrada no sistema.