TJSP 21/01/2009 - Pág. 37 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quarta-feira, 21 de Janeiro de 2009
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte I
São Paulo, Ano II - Edição 398
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contraditórias, passa à análise do fato objeto do processo. Alega a devedora que os valores depositados em sua conta bancária
são impenhoráveis, pois decorrem de seus vencimentos. Observo inicialmente que não se trata de conta apenas para
recebimento de salário, porquanto se verifica movimentação de débitos e créditos na referida conta corrente, desta forma não se
trata de tipica “conta-salário.” O documento de fls. 226, informa que os proventos da devedora são no valor de R$ 6.867,83. Não
se pode dizer que todos os valores que são recebidos pelo devedor a título de pagamento pelo seu trabalho sejam impenhoráveis,
porquanto tais valores não são destinados “exclusivamente” ao seu sustento, parte deles fica na conta outra parte é destinada à
aquisição de bens e investimentos, como é notório. Os valores que permanecem livres na conta corrente, ainda que decorram
do pagamento de salário ou vencimento perdem esta qualidade, porquanto não são mais indispensáveis ao sustento do devedor
e sua família. Não bastasse, o salário mínimo é de R$ 415,00. Este valor é considerado pela Constituição Federal em seu artigo
7º, inciso IV, como suficiente ao atendimento das “necessidades vitais básicas e às de sua família como moradia, alimentação,
educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social,..” (sic). O devedor recebe mensalmente a quantia
líquida de R$ 6.867,83 (fls. 226), portanto cerca de 16.548 salários mínimos. Desta forma não é possível a extensão pretendida
pela devedora do disposto no artigo 649 do Código de Processo Civil, tornando a integralidade de seu salário ou vencimentos
impenhoráveis, inviabilizando o Poder Judiciário de fazer Justiça, ou de dar a credor uma resposta “justa”. Ninguém em sã
consciência é capaz de afirmar que a devedora deva ficar sem pagar a dívida que contraiu, pouco importa quem seja seu credor,
pois a regra que pode hoje discriminar o credor rico é a mesma regra que impede o pobre de receber do rico. Exemplo: o
pedreiro ou pintor que não pode penhorar pequeno percentual daquele que ganha altíssimo salário. Onde fica a Justiça? Ora,
quem deve tem a obrigação moral e legal de pagar! O salário, por sua vez, representa o que o trabalhador aufere para cumprir
com suas obrigações, sejam elas para sua sobrevivência, sejam elas para seu deleite pessoal que também é considerado como
indispensável à dignidade humana; assim pelo menos parte dele, desde que não inviabilize a sobrevivência do devedor, pode
ser penhorado para fazer Justiça ao credor, pois o “crédito”, em última análise, tem na sua origem finalidade de sobrevivência e
manutenção da dignidade do devedor, ou seja, era este também o motivo do devedor quando procurou e obteve o crédito que
hoje se recusa a pagar. Deste modo, a sobrevivência e a dignidade humana, é também causa remota do “crédito constituído”, os
valores que ele representa possibilitaram ao devedor sua sobrevivência e sua dignidade, agora depois de utilizados, na hora de
pagar, não se pode esquecer dos benefícios que proporcionou ao devedor e sua família. Posto isto, por ferir o princípio geral de
direito acima mencionado - a qualidade do que é “Justo” - e os princípios constitucionais do artigo 3º, inciso I, combinado com
artigo 7º, inciso IV, ambos da Constituição Federal, a vedação “absoluta” do artigo 649,IV, do Código de Processo Civil, é
inconstitucional. Considero-a relativa para que percentual dos vencimentos, dentro dos limites que a lei admite sejam
comprometidos, possam ser penhorados para pagamento ao credor. Frise-se, finalmente, que a deliberação de penhora de
percentual que não compromete a sobrevivência do devedor, além de fazer Justiça ao credor torna a execução menos onerosa
ao devedor, porquanto lhe possibilita cumprir a obrigação de forma parcelada sem novos ônus de editais, diligências, intimações,
ou seja, despesas processuais. Assim, a providência está, também, em perfeita concatenação com o artigo 620 do Código de
Processo Civil, cujo comando é destinado exclusivamente ao “Juiz da execução”. Destarte, considerado que os valores recebidos
pela devedora, nos termos da Constituição Federal, são mais que suficientes à sua manutenção e de seus familiares, fica
mantido o bloqueio judicial, entretanto ele será reduzido a 20% dos seus vencimentos mensais, até liquidação do débito objeto
deste processo. A providência é indispensável para tornar efetiva a prestação jurisdicional, porquanto não foram localizados
bens da devedora, tampouco ela indicou bem que pudesse garantir a execução. Adotando posição semelhante, o Tribunal de
Justiça de São Paulo manteve decisão deste juízo: “Agravo de Instrumento. Execução de Título judicial. Penhora “on line”
reduzida para 15% sobre os vencimentos do executado. Não tendo ocorrido a penhora sobre 100% dos vencimentos , mas
apenas 15%, tal ato não causa onerosidade excessiva, porque não está além daquele patamar permitido para o caso de
consignação em folha de pagamento (1/3 dos vencimentos), situação que se equipara à hipótese dos autos, e ainda, preserva a
dignidade e as condições de sobrevivência do devedor, que é médico, executado no valor de R$ 2.313,74 (fls. 72). Ausência de
violação à impenhorabilidade de salário. Razoabilidade e proporcionalidade. RECURSO NÃO PROVIDO” (sic). (Ag. Inst. Nº
7.132.690-0, 14ª Câm. Dto. Priv. “B” - Rel. Gioia Perini). Até o próprio STJ já trilha por este caminho para considerar a
possibilidade de penhora de percentual dos vencimentos, numa inequívoca interpretação de que a vedação do artigo 649, IV, é
relativa e não absoluta. Confira-se: (REsp 770797 / RS ; RECURSO ESPECIAL 2005/0125594-1, Relatora Ministra NANCY
ANDRIGHI (1118), Órgão Julgador T3 - TERCEIRA TURMA, j. 29/11/2006, DJ 18.12.2006 p. 377 RDDP vol. 48 p. 170) Ementa
“DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. FAMÍLIA. EXECUÇÃO DE ALIMENTOS. PENHORA DE APOSENTADORIA.
POSSIBILIDADE. ART. 649, IV E VII, DO CPC. PENHORA DA INTEGRALIDADE DO VALOR DA APOSENTADORIA.
INADMISSIBILIDADE. NECESSIDADE DE FIXAÇÃO EM PERCENTUAL QUE POSSIBILITE A SUBSISTÊNCIA DO EXECUTADOALIMENTANTE. - Os proventos líquidos de aposentadoria podem ser penhorados para pagamento de execução de pensão
alimentícia, não obstante o inc. VII, do art. 649, do CPC silencie a esse respeito. - Para pagamento de prestação alimentícia,
não pode ser penhorada a integralidade dos proventos líquidos de aposentadoria, mas apenas um percentual que permita o
indispensável à subsistência do executado-alimentante; que, na espécie, é fixado em 66% dos proventos líquidos da
aposentadoria mensal do recorrente. Recurso especial provido apenas para adequação do percentual da penhora”. (AgRg no Ag
688511 / RS ; AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO 2005/0104774-6, Relator Ministro ALDIR PASSARINHO
JUNIOR (1110), Órgão Julgador T4 - QUARTA TURMA, j. 06/10/2005, DJ 21.11.2005 p. 252). Ementa “PROCESSUAL CIVIL.
AGRAVO REGIMENTAL. EXECUÇÃO. PENHORA SOBRE DINHEIRO. BANCO. ONEROSIDADE. SÚMULA N. 83/STJ.
PRECEDENTES. I. Esta Corte Superior tem fixado o entendimento que preconiza a possibilidade de a penhora recair sobre
saldo existente em conta-corrente sem que ocorra ofensa ao princípio da menor onerosidade para o devedor. II. Precedentes do
STJ. III. A mitigação do art. 620 do CPC deve ser analisada à luz das peculiaridades de cada caso, não devendo nunca ser
utilizada como instrumento para subverter a ordem lógica e natural do processo de execução. IV. Agravo regimental desprovido”.
Outros Tribunais Estaduais, atentos a esta peculiaridade, também já começaram a trilhar entendimento semelhante, confira-se:
“PROCESSO CIVIL - AGRAVO DE INSTRUMENTO - PENHORA EM DINHEIRO - CONTA SALÁRIO - 1) Correta é a decisão
monocrática que determinou a penhora de valores existentes em conta corrente que não tinham natureza alimentar. Assim,
somente a quantia destinada à subsistência do devedor e de sua família são impenhoráveis. 2) Agravo não provido”. (TJAP - Ag
44800 - (5376) - C.Única - Rel. Des. Conv. Juiz Mário Mazurek - DOEAP 24.04.2003 - p. 28) “CONTA SALÁRIO - AUSÊNCIA DE
COMPROVAÇÃO - LEGITIMIDADE DA PENHORA EM CONTA - CORRENTE - SEGURANÇA DENEGADA - Afigura-se correto o
ato do MM. Juízo da execução que, ante a falta de outros bens que efetivem a liquidez da dívida trabalhista, determina a
penhora em conta- corrente de sócio da empresa executada, primando, assim, pela rápida satisfação do crédito trabalhista.
Ressalte-se que o impetrante não comprovou em momento algum que a conta bancária bloqueada pelo MM. Juízo impetrado
destina-se exclusivamente ao recebimento de salários e proventos de sua aposentadoria, pelo que não há que se falar nos
benefícios previstos no artigo 649, do Código de Processo Civil. Nessa conformidade, a constrição do citado numerário é
plenamente legítima, além de figurar o bem em questão, em primeiro lugar no rol elencado no artigo 655 do Código de Processo
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º