TJSP 11/10/2012 - Pág. 2010 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quinta-feira, 11 de Outubro de 2012
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano VI - Edição 1285
2010
do financiamento. A requerida apresentou defesa a fls. 18/41, acompanhada de cópia da cédula de crédito bancário decorrente
do contrato de mútuo encetado com a autora (fls. 61). No mais, dispensado o relatório nos termos do artigo 38, caput, da Lei
9.099/95. FUNDAMENTO e DECIDO. Afasto a decadência argüida, pois esta não se aplica no caso em tela, tendo em vista que
sua invocação se dá quando há vício de produto ou serviço e não abusividade de cláusula pactuada em contrato de adesão, a
tese invocada pela requerente. As demais preliminares confundem-se com o mérito e com este serão analisadas. Cuida-se de
pedido de restituição de tarifas indevidamente pagas pelo requerente em virtude do financiamento de um veículo automotor.
Alega a autora que tais tarifas foram embutidas indevidamente no valor das parcelas, sustentando representarem indevida
vantagem auferida pela instituição financeira. A requerida apresentou contestação sustentando a legalidade da cobrança das
tarifas impugnadas. Consoante cópia da cédula de crédito bancária encartada a fls. 61 verifica-se que, dentre as cobranças
aduzidas na inicial, foram efetivadas, na contratação com a autora, registro de gravame (R$ 35,00) e seguro auto (R$ 197,50).
Na tentativa de moralizar as operações de crédito que englobam os financiamentos de veículos o Banco Central baixou a
resolução 3517, de dezembro de 2007, que passou a valer em 03 de março de 2008, e dispõe sobre a informação e a divulgação
do custo efetivo total correspondente a todos os encargos e despesas de operações de crédito e de arrendamento mercantil
financeiro, contratadas ou ofertadas a pessoas físicas. A resolução obriga que todas as instituições financeiras entreguem aos
clientes um documento chamado Custo Efetivo Total (CET), e nele, o consumidor tem descrito em detalhes tudo o que está
pagando: o valor financiado, os juros, impostos, taxas, seguros, entre outros, incluindo até os chamados “serviços de terceiros”,
onde deverá estar mencionada a taxa de retorno. Cabe assinalar que a resolução não proíbe a utilização de taxas de retorno ou
outros adicionais, no entanto, deve ser deixado bem claro ao consumidor tudo o que ele está pagando por meio do Custo Efetivo
Total (CET) que deve ser entregue ao cliente antes da contratação da operação de crédito. No entanto, a ausência de proibição,
pelo Banco Central, não induz à legalidade das cobranças encetadas, as quais são abusivas face ao Código de defesa do
Consumidor. No tocante à cobrança a título de “registro de contrato”, e se tratando da cobrança a título de “taxa de gravame”, é
do interesse da Instituição Financeira a publicidade acerca do gravame presente sobre o bem e decorrente do contrato de
mútuo, não lhe sendo lícito, portanto, o repasse do custo deste serviço ao consumidor. Tal encargo sequer está previsto na
resolução e circular do Bacen como passível de cobrança ao consumidor. Ademais, a instituição financeira cobrou o valor de R$
35,00, mas não informou onde promoveu o mencionado registro do contrato ou qual seria a utilidade do citado registro. Ou seja,
sequer há indício da efetivação do registro do contrato, há apenas certeza da cobrança de tal encargo de maneira diluída nas
parcelas do financiamento. Igualmente indevida a cobrança a título de “Seguro Auto”, no importe de R$ 197,50. Sequer há
cláusula contratual permitindo cobrança de seguro no bojo do contrato de financiamento inexistindo, ademais, qualquer apólice
em separado a especificar o seguro mencionado na cédula de crédito de fls. 61. A se tomar por base as cláusulas do contrato,
especialmente a de número 19, existe a previsão de que o “seguro de proteção financeira, caso contratado mediante assinatura
de apólice de seguro separada, poderá ser incluído no valor devido à credora”. Tal seguro, pessoal e intransferível, destinar-seia à cobertura de eventual saldo devedor (em que pese o bem haver sido alienado fiduciariamente em garantia...), mas
dependeria da assinatura apartada de apólice de seguro, apólice esta inexistente e que não foi apresentada pela instituição
financeira nem tampouco mencionada na defesa. As cobranças indevidas ainda se revestem de maior abusividade e sem
possibilidade de ingerência do consumidor porque insertas em contrato de adesão. Tendo sido o contrato de financiamento
encetado por meio de contrato de adesão, há que se desbastar o excesso contratual do valor mais elevado, para se aplicar a
eqüidade. Carlos Maximiliano delineia as diretrizes de interpretação do contrato de adesão: a) contra aquele em benefício do
qual foi feita a estipulação; b) a favor de quem a mesma obriga e, portanto, em prol do devedor e do promitente; c) contra o que
redigiu o ato ou cláusula, ou melhor, contra o causador da obscuridade ou omissão” (“Hermenêutica e Aplicação do Direito”, pág.
351). Além dessa interpretação favorável ao aderente, deve ser levada em consideração a relação de consumo existente entre
o mutuário e a instituição financeira, aplicando-se para tanto o disposto no art. 47 da Lei n° 8.078/90 que estabelece: “As
cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”. Ao Direito cabe a tarefa de impor o
equilíbrio nas relações contratuais e a Justiça a de interpretar a manifestação de vontade das partes. A propósito do tema, não
foi inutilmente que se inseriu no Código Civil Brasileiro a disposição do art. 85, in verbis: “As declarações de vontade se atenderá
mais a sua intenção que ao sentido literal da linguagem”. Para tanto, o absolutismo do pacta sunt servanda, herdado do Direito
Canônico, cede espaço de forma crescente para limitação da autonomia da vontade, submete-se o instrumento ao princípio do
dirigismo contratual. O Código de Defesa do Consumidor é um exemplo típico da intervenção do Estado nas relações contratuais,
plenamente justificável pela predominância dos “métodos de contratação em massa”, na expressão de Enzo Roppo, na obra “O
Contrato”, pág. 313. No contrato de adesão o seu conteúdo é preestabelecido por uma das partes, restando à outra somente a
possibilidade de aceitar em bloco as cláusulas estabelecidas, sem poder modificá-las substancialmente, ou, então, recusar o
contrato e procurar outro fornecedor de bens. Assim, os consumidores que desejarem contratar com a empresa ou mesmo com
o Estado já receberão pronta e regulamentada, geralmente em formulários impressos, a relação contratual, seus direitos e
obrigações, não havendo negociação contratual dos termos desse contrato. Desta maneira, limita-se o consumidor a aceitar
(muitas vezes sem sequer ler completamente) as cláusulas do contrato, assumindo um papel de simples aderente à vontade
manifestada pela empresa no instrumento contratual massificado”(“Direito do Consumidor”, vol. 1, Ed. Revista dos Tribunais; “
‘’Novas Regras sobre a Proteção do Consumidor das Relações Contratuais”, Cláudia Lima Marques, pág. 30) . O artigo 54 do
Código de Defesa do Consumidor define o contrato de adesão como aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela
autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa
discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo. Assim, as cláusulas duvidosas serão entendidas pelas que não o forem, e
que as partes tiverem admitido. As antecedentes e subseqüentes que estiverem em harmonia, explicarão as ambíguas. Nos
casos duvidosos, decidir-se-á em favor do devedor. No caso dos autos, o que se verifica é a cobrança a título de registro de
gravame e seguro auto que, de fato, encareceram o financiamento contratado em cerca de R$ 232,50 (fls. 61), em consonância
com a estipulação prevista na inicial. Assim, de rigor a declaração de nulidade das cláusulas que possibilitam a cobrança de tais
tarifas posto serem abusivas, não tendo sido dada oportunidade ao consumidor para discutir tais cláusulas, insertas no contrato
de adesão e que representam custos do serviço de concessão de financiamento que deve ser suportado pela instituição
financeira. Neste sentido: “CONTRATO - Financiamento - Relação de consumo caracterizada - Possibilidade de discussão das
cláusulas contratuais - Princípio do ‘pacta sunt servanda’ que não é absoluto - Integração da relação contratual pelo Judiciário
para restabelecer o equilíbrio contratual - Recurso provido. JUROS REMUNERATÓRIOS - Contrato de financiamento - Existência
de estipulação contratual relativa à taxa a ser cobrada - Manutenção de tal taxa, pois foi expressamente pactuada - Hipótese,
entretanto, em que deve ser cobrada a taxa fixada no contrato (2,5032500% ao mês), sem capitalização - Prática não permitida
- Recurso provido. CONTRATO - Financiamento - Pretensão à devolução dos valores cobrados a título de Taxa de Abertura de
Crédito (TAC), Tarifa de Emissão de Carne (TEC) e honorários advocatícios na fase de cobrança extrajudicial - Admissibilidade
- Hipótese em que tais cobranças contrariam o disposto no art. 51, IV e XII do CDC - Recurso provido.” CONTRATO.
FINANCIAMENTO. TARIFAS. ABUSIVIDADE. 1. Embora contratualmente previstas, é abusiva a cobrança de tarifa de inclusão
Publicação Oficial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo - Lei Federal nº 11.419/06, art. 4º