TJSP 11/10/2012 - Pág. 2014 - Caderno 4 - Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: Quinta-feira, 11 de Outubro de 2012
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 1ª Instância - Interior - Parte II
São Paulo, Ano VI - Edição 1285
2014
documento chamado Custo Efetivo Total (CET), e nele, o consumidor tem descrito em detalhes tudo o que está pagando: o valor
financiado, os juros, impostos, taxas, seguros, entre outros, incluindo até os chamados “serviços de terceiros”, onde deverá
estar mencionada a taxa de retorno. Cabe assinalar que a resolução não proíbe a utilização de taxas de retorno ou outros
adicionais, no entanto, deve ser deixado bem claro ao consumidor tudo o que ele está pagando por meio do Custo Efetivo Total
(CET) que deve ser entregue ao cliente antes da contratação da operação de crédito. No entanto, a ausência de proibição, pelo
Banco Central, não induz à legalidade das cobranças encetadas, as quais são abusivas face ao Código de defesa do Consumidor.
No tocante a tarifa de abertura de crédito (TAC), aqui designada de “tarifa de cadastro”, esta visa cobrir os custos administrativos
da abertura de crédito e tem por fato gerador, conforme especificado na Circular 3371 do Bacen, de 06.12.2007, “a realização
de pesquisa em serviços de proteção ao crédito (...) e informações necessárias ao início de relacionamento de conta corrente de
depósitos, conta de depósitos de poupança e operações de crédito e de arrendamento mercantil.” A chamada TAC tem como
causa de sua incidência a concessão do crédito, não representando uma prestação de serviço ao cliente, uma vez que o banco
apenas visa se socorrer de meios para diminuir os riscos de sua atividade, sendo seu interesse as informações angariadas nas
consultas realizadas. A cobrança dessa tarifa é nula, nos termos do artigo 46 e 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor.
A realização de pesquisas sobre os dados cadastrais do cliente não caracteriza serviço solicitado ou prestado ao consumidor,
mas tão somente uma análise do negócio para resguardar e minimizar o risco do banco, risco esse que é inerente à própria
atividade desempenhada pelas instituições financeiras não sendo, portanto, lícita a cobrança de tal custo ao consumidor,
especialmente quando incluída a cobrança em contrato de adesão. O mesmo se diga com relação à cobrança a título de “registro
de contrato”. Tal encargo sequer está previsto na resolução e circular do Bacen como passível de cobrança ao consumidor.
Ademais, a instituição financeira cobrou o valor de R$ 91,42, mas não informou onde promoveu o mencionado registro do
contrato ou qual seria a utilidade do citado registro. Ou seja, sequer há indício da efetivação do registro do contrato, há apenas
certeza da cobrança de tal encargo de maneira diluída nas parcelas do financiamento. Igualmente indevida a cobrança a título
de “serviços de terceiros”, vez que sequer é mencionado qual tipo de serviço está sendo cobrado, mas a se tomar pela prática
de cobrança em contratos similares, vislumbra-se tratar-se de “taxa de retorno” paga ao vendedor do veículo financiado em
virtude da indicação da instituição financeira como operadora de crédito a fornecer o valor necessário para a aquisição do
automóvel. Assim sendo, a taxa de retorno ou serviço de terceiro, como consignado na cédula de crédito bancário, é uma
espécie de comissão que o banco ou financeira paga ao lojista em razão do financiamento engajado por meio de sua
intermediação ou indicação, funcionando como uma forma de fidelização entre instituição financeira e lojista. Abusiva a cobrança
de taxa de retorno, aqui designada serviço de terceiro, vez que ilegal a prática de cobrar de clientes as despesas relativas aos
custos do financiamento. É o próprio banco quem deve arcar com tal despesa até porque taxa de retorno corresponde ao valor
de uma comissão paga ao lojista por indicar determinada instituição financeira como agente financiador, nada tendo a ver tal
comissão com o custo do bem a ser adquirido, ou mesmo com o custo do financiamento do bem. Melhor analisando a hipótese,
o consumidor paga a “tarifa” ou “taxa de retorno”, embutida nas parcelas do financiamento porque aceitou financiar o bem
adquirido do lojista pela financeira que trabalha em parceria com ele, sem olvidar que, em geral, o financiamento é encetado no
interior da própria agencia vendedora do veículo, tudo a praticamente impedir que o consumidor contrate em outro lugar o
financiamento de seu automóvel, e ainda paga mais por isso sob os auspícios de vantagens e facilidades. A cobrança de tal
tarifa é abusiva nos termos do artigo 39, V, CDC e a cláusula que autoriza sua cobrança nula de pleno direito nos termos do
artigo 51, IV, XV do CDC. As cobranças indevidas ainda se revestem de maior abusividade e sem possibilidade de ingerência do
consumidor porque insertas em contrato de adesão. Tendo sido o contrato de financiamento encetado por meio de contrato de
adesão, há que se desbastar o excesso contratual do valor mais elevado, para se aplicar a eqüidade. Carlos Maximiliano delineia
as diretrizes de interpretação do contrato de adesão: a) contra aquele em benefício do qual foi feita a estipulação; b) a favor de
quem a mesma obriga e, portanto, em prol do devedor e do promitente; c) contra o que redigiu o ato ou cláusula, ou melhor,
contra o causador da obscuridade ou omissão” (“Hermenêutica e Aplicação do Direito”, pág. 351). Além dessa interpretação
favorável ao aderente, deve ser levada em consideração a relação de consumo existente entre o mutuário e a instituição
financeira, aplicando-se para tanto o disposto no art. 47 da Lei n° 8.078/90 que estabelece: “As cláusulas contratuais serão
interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”. Ao Direito cabe a tarefa de impor o equilíbrio nas relações contratuais
e a Justiça a de interpretar a manifestação de vontade das partes. A propósito do tema, não foi inutilmente que se inseriu no
Código Civil Brasileiro a disposição do art. 85, in verbis: “As declarações de vontade se atenderá mais a sua intenção que ao
sentido literal da linguagem”. Para tanto, o absolutismo do pacta sunt servanda, herdado do Direito Canônico, cede espaço de
forma crescente para limitação da autonomia da vontade, submete-se o instrumento ao princípio do dirigismo contratual. O
Código de Defesa do Consumidor é um exemplo típico da intervenção do Estado nas relações contratuais, plenamente justificável
pela predominância dos “métodos de contratação em massa”, na expressão de Enzo Roppo, na obra “O Contrato”, pág. 313. No
contrato de adesão o seu conteúdo é preestabelecido por uma das partes, restando à outra somente a possibilidade de aceitar
em bloco as cláusulas estabelecidas, sem poder modificá-las substancialmente, ou, então, recusar o contrato e procurar outro
fornecedor de bens. Assim, os consumidores que desejarem contratar com a empresa ou mesmo com o Estado já receberão
pronta e regulamentada, geralmente em formulários impressos, a relação contratual, seus direitos e obrigações, não havendo
negociação contratual dos termos desse contrato. Desta maneira, limita-se o consumidor a aceitar (muitas vezes sem sequer ler
completamente) as cláusulas do contrato, assumindo um papel de simples aderente à vontade manifestada pela empresa no
instrumento contratual massificado” (“Direito do Consumidor”, vol. 1, Ed. Revista dos Tribunais; “ ‘’Novas Regras sobre a
Proteção do Consumidor das Relações Contratuais”, Cláudia Lima Marques, pág. 30) . O artigo 54 do Código de Defesa do
Consumidor define o contrato de adesão como aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou
estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar
substancialmente seu conteúdo. Assim, as cláusulas duvidosas serão entendidas pelas que não o forem, e que as partes tiverem
admitido. As antecedentes e subseqüentes que estiverem em harmonia, explicarão as ambíguas. Nos casos duvidosos, decidirse-á em favor do devedor. No caso dos autos, o que se verifica é a cobrança a título de tarifa de cadastro, registro de contrato e
pagamento de serviço de terceiros que, de fato, encareceram o financiamento contratado em R$ 1180,01 (fls. 09), em
consonância com a estipulação prevista na inicial. Assim, de rigor a declaração de nulidade das cláusulas que possibilitam a
cobrança de tais tarifas posto serem abusivas, não tendo sido dada oportunidade ao consumidor para discutir tais cláusulas,
insertas no contrato de adesão e que representam custos do serviço de concessão de financiamento que deve ser suportado
pela instituição financeira. Neste sentido: “CONTRATO - Financiamento - Relação de consumo caracterizada - Possibilidade de
discussão das cláusulas contratuais - Princípio do ‘pacta sunt servanda’ que não é absoluto - Integração da relação contratual
pelo Judiciário para restabelecer o equilíbrio contratual - Recurso provido. JUROS REMUNERATÓRIOS - Contrato de
financiamento - Existência de estipulação contratual relativa à taxa a ser cobrada - Manutenção de tal taxa, pois foi expressamente
pactuada - Hipótese, entretanto, em que deve ser cobrada a taxa fixada no contrato (2,5032500% ao mês), sem capitalização Prática não permitida - Recurso provido. CONTRATO - Financiamento - Pretensão à devolução dos valores cobrados a título de
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