TJSP 11/05/2017 - Pág. 713 - Caderno 2 - Judicial - 2ª Instância - Tribunal de Justiça de São Paulo
Disponibilização: quinta-feira, 11 de maio de 2017
Diário da Justiça Eletrônico - Caderno Judicial - 2ª Instância
São Paulo, Ano X - Edição 2344
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Médica Internacional S/AST - Agravada: BEATRIZ PAIVA VERCELLI - 1. Trata-se de ação de obrigação de fazer, onde relata a
autora BEATRIZ PAIVA VERCELLI que é portadora de Síndrome de Down e lhe foi recomendado tratamento multidisciplinar,
com duas sessões semanais de terapia ocupacional, duas sessões semanais de fonoaudiologia e uma sessão semanal de
psicoterapia. A partir de agosto de 2016, a ré AMIL passou a negar a cobertura dos tratamentos, sob a alegação de ter excedido
o número de sessões contratuais, sem fornecer o extrato dos serviços já prestados. Pugnou pela concessão de tutela de
urgência, para que houvesse a continuidade da cobertura dos tratamentos, independentemente do número de sessões e por
tempo ilimitado, o que foi deferido pelo juízo a quo, a ser cumprido no prazo de cinco dias, sob pena de aplicação de multa diária
de R$ 10.000,00 até o limite de R$ 100.000,00, esta a razão do inconformismo da ré. Alega que a cláusula contratual que limita
o número de sessões de tratamento não é iníqua nem injusta, atendendo ao limite estabelecido pela ANS. Ademais, alega que o
valor da multa aplicada é excessivo e desproporcional, fugindo ao seu objetivo e levando ao enriquecimento sem causa da
autora. Assim, pugnou pela concessão de efeito suspensivo, a fim de que torne sem efeitos a r. decisão de fls. 332/334 até a
decisão final deste Agravo de Instrumento, nos termos do art. 1.019, inciso I, do Código de Processo Civil. Ao final, requereu a
revogação da tutela concedida. 2. Indefiro a concessão de efeito suspensivo a este recurso, pleiteado pela agravante. O art. 300
do CPC/2015 exige, para a concessão da medida, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do
processo. A recusa, em primeira análise dos autos, foi abusiva. Com efeito, o limite de exclusão imposto pelo contrato deve ser
avaliado com ressalvas, observado de maneira concreta que a natureza da relação ajustada entre as partes e os fins do contrato
celebrado, não podem ameaçar o objeto da avença, bastando para tanto que se confira a previsão do artigo 51, IV e §1º, II,
todos do CDC. JORGE ALBERTO QUADROS DE CARVALHO SILVA, na obra “Cláusulas Abusivas no Código de Defesa do
Consumidor”, Ed. Saraiva, 2003, cuidando do princípio da proteção jurídica do consumidor e da sanção às cláusulas abusivas
diz que: “As sanções às cláusulas abusivas são necessárias e fundamentais para a reequalização da posição jurídica das partes
contratantes, pois não adiantaria nada reconhecer e declarar a situação de opressão sem que sua causa fosse efetivamente
extirpada do ordenamento jurídico. Mera constatação por si só não resultaria em nada se não fosse dado ao interprete da lei
instrumentos necessários para eliminar o mal causador do desequilíbrio no sinalagma.” O contrato de plano de saúde, por ser
atípico, consubstancia função supletiva do dever de atuação do Estado, impondo-se a proteção da saúde do segurado e de seus
familiares contra qualquer enfermidade e em especiais circunstâncias, como aquela que aqui se vê, onde a manutenção dos
tratamentos terápicos multidisciplinares a que tem de se submeter a apelante é necessária, e temerária sua interrupção. O
comportamento levado a cabo pela agravante, que se nega à continuidade do custeio das terapias que vem sendo prestadas à
agravada de maneira eficiente e satisfatória, desequilibra a relação contratual, colocando a apelante em situação de desamparo,
pois é certo que a situação onera em demasia o consumidor. É certo, ainda, que não se poderia, num primeiro momento, negarse ao custeio. A responsabilidade da operadora emerge da negativa da cobertura integral a seu encargo em decorrência de
contrato vigente. Ademais, esta Câmara entende que nesses casos prevalece o direito à vida, garantia constitucional do art. 5º
da CF de 1988. Os procedimentos de saúde não devem sofrer limitações, quando há paciente em tratamento de enfermidade,
como é o caso em exame. Trata-se de limitação ao impor a restrição de número de sessões anuais de terapias a que teria direito
a autora, fugindo ao objeto do contrato, que é assegurar o tratamento quando o beneficiário dele necessitar, mediante pagamento
do prêmio mensal. Com efeito, a Lei n. 9.656/98, em seu art. 12, II, “a”, nos ensina que é assegurada, “cobertura de internações
hospitalares, vedada a limitação de prazo, em clínicas básicas e especializadas”. Confira-se julgado a respeito, em analogia:
“Cláusula que fixa limite de prazo para internação Inadmissibilidade Caracterização de cláusula leonina” (Apelação Cível n.
60.459-4 6ª Câmara de Direito Privado Rel. Octávio Helene j. 11.02.99, v.u.) Do julgamento da Apelação nº 906133807.2009.8.26.0000, da 1ª Câmara de Direito Privado, cujo Relator foi o Desembargador ELLIOT AKEL, extrai-se que “A
estipulação de limite na quantidade de dias de internação por período contratual, quando redunda em prazos exíguos e
insuficientes para o perfeito restabelecimento do destinatário da cobertura em situações de maior gravidade, pode ser
considerada iníqua, configurando afronta ao sistema protetivo do consumidor” e ainda “Já fixou a jurisprudência do C. Superior
Tribunal de Justiça que ‘é abusiva a cláusula que limita no tempo a internação do segurado, o qual prorroga a sua presença em
unidade de tratamento intensivo ou é novamente internado em decorrência do mesmo fato médico, fruto de complicações da
doença, coberto pelo plano de saúde. O consumidor não é senhor do prazo de sua recuperação, como é curial, depende de
muitos fatores, que nem mesmo os médicos são capazes de controlar. Se a enfermidade está coberta pelo seguro, não é
possível, sob pena de grave abuso, impor ao segurado que se retire da unidade de tratamento intensivo, com o risco severo de
morte, porque está fora do limite temporal estabelecido em uma determinada cláusula. Não pode a estipulação contratual
ofender o princípio da razoabilidade, e se o faz, comete abusividade vedada pelo art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor.
Anote-se que a regra protetiva, expressamente, refere-se a uma desvantagem exagerada do consumidor e, ainda, a obrigações
incompatíveis com a boa-fé e equidade’ (REsp. 158.728-RJ, rel. Min. Menezes Direito, j. 16.03/1999). Aliás, tal questão já
resultou pacificada por aquela Corte com a edição da Súmula 302, segundo a qual ‘é abusiva a cláusula contratual de plano de
saúde que limita no tempo a internação do segurado.’ “ No próprio TJ-SP, na Súmula 92, consta, verbis: “Abusiva a cláusula
contratual que limita a internação do usuário do Plano de Saúde ou do segurado Súmula 302 do Superior Tribunal de Justiça”.
São inúmeros os precedentes (Apelação Cível 994.06.029145-0, Relator Elliot Akel; Apelação Cível 9189769-93.2008.8.26.0000,
Relator Paulo Eduardo Razuk; Apelação Cível 0115582-44.2006.8.26.0000, Relator Neves Amorim; Apelação Cível
994.09.346420-0, Relator Donegá Morandini; Apelação Cível 994.06.121600-9, Relator Jesus Lofrano; Apelação Cível 000735527.2010.8.26.0482, Relator Enio Zuliani; Apelação Cível 0109594-76.2005.8.26.0000, Relator Teixeira Leite; Apelação Cível
9088066-90.2006.8.26.0000, Relator: Gilberto de Souza Moreira; Apelação Cível 563.233-4/4-00, Relatora Christine Santini;
Apelação Cível 9119636-94.2006.8.26.0000, Relator Paulo Alcides; Apelação Cível 9201711-88.2009.8.26.0000, Relator
Sebastião Carlos Garcia; Apelação Cível 9211671-73.2006.8.26.000, Relator: Milton Carvalho; Apelação Cível 002125310.2010.8.26.0482, Relator Salles Rossi; Apelação Cível 9126624-68.2005.8.26.0000, Relator: Piva Rodrigues; Apelação Cível
0073013-62.2005.8.26.0000, Relator: Viviani Nicolau). Quanto à alegação da apelante de que a cláusula restritiva tem apoio em
resolução da ANS, merece transcrição parte do acórdão relativo ao último julgamento acima mencionado: “Nem se diga que a
Resolução CONSU nº 11 estaria a autorizar uma limitação que a própria lei pretendia evitar. Esta Corte já teve a oportunidade
de apreciar a questão, assentando que ‘[...] a Resolução n. 11 do Conselho de Saúde Suplementar não se presta a amparar a
negativa de cobertura contratual, posto que se trata de norma administrativa de conteúdo incompatível com os preceitos
instituídos pela legislação em comento e, portanto, eivada de manifesta ilegalidade, cf. entendimento exposto em precedentes
desta Corte: Apel. Cível n. 994.09.299588-0 rel. Des. VITO GUGLIELMI 6ª Câm. Direito Privado j. 04.03.2010; Apel. Cível n.
994.07.119935-2 rel. Des. SALLES ROSSI 8ª Câm. Direito Privado j. 29.07.2009’ (Apelação Cível nº 994.07.038082-9 6ª Câm.
de Direito Privado TJ-SP Des. Roberto Solimene j. em 13/08/2010)” A limitação da quantidade de sessões indicadas para o
restabelecimento ou melhora do paciente, e a exclusão do custeio de todas as sessões de terapias indicadas, para o caso da
autora, fogem justamente ao objeto do contrato, que é assegurar tratamento ao segurado quando este necessitar. Nesse sentido:
“EMENTA: SEGURO SAÚDE OBRIGAÇÃO DE FAZER Seguradora que nega cobertura a tratamento de dependência química,
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