TJBA 26/07/2022 - Pág. 2008 - CADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.144 - Disponibilização: terça-feira, 26 de julho de 2022
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Ao impingir, ao consumidor, o contrato de cartão consignado, a instituição financeira, acaba por impor-lhe um mútuo com condições manifestamente mais desvantajosas, uma vez que o remanescente aferido após desconto de cada parcela, como visto,
submete-se aos altos juros do crédito rotativo de cartão de crédito.
É de se ver, nesta toada, que os valores descontados, mês a mês, a título de pagamento mínimo, aproximam-se bastante daqueles cobrados pelo banco a título de encargos rotativos.
Ao assim proceder, o banco impõe ao consumidor uma modalidade contratual que só traz vantagens à instituição financeira, com
óbvio intuito de perpetuar o pagamento da dívida contraída, quando, repita-se, o consumidor teria acesso, junto à própria instituição financeira, a modalidades muito mais vantajosas, de que é exemplo o contrato de empréstimo com consignação em folha.
Desta forma, tal modalidade de contratação está a violar o disposto nos artigos 39, I, IV e V, 51, IV e 52, do CDC, de tal forma
a declarar-se sua nulidade absoluta.
Neste sentido:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE RELAÇÃO JURÍDICA E DÉBITO CUMULADO COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. EMPRÉSTIMO CONSIGNADO E ADESÃO DE CARTÃO DE CRÉDITO. PRÁTICA ILÍCITA E
ABUSIVA DE VENDA CASADA. EXEGESE DO ARTIGO 39 E INCISOS DO CÓDIGO DO CONSUMIDOR. BLOQUEIO DE MARGEM CONSIGNÁVEL NO BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO DO AUTOR. BANCO QUE SE APROVEITOU DA NECESSIDADE
FINANCEIRA E IDADE AVANÇADA DO AUTOR. CARTÃO DE CRÉDITO QUE NÃO FOI DESBLOQUEADO. IMPOSSIBILIDADE
DA INCLUSÃO DA RESERVA SEM A UTILIZAÇÃO DO CARTÃO. DANO MORAL CONFIGURADO. DEVER DE INDENIZAR
CABIDO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. Configura procedimento abusivo o banco que aproveitando-se da idade avançada e da necessidade financeira do consumidor, o compele a aderir ao cartão de crédito no momento
da assinatura do contrato de empréstimo, com a posterior reserva de margem consignável no benefício previdenciário, impondo
a obrigação de somente com ele contratar. RECURSO ADESIVO. AUSÊNCIA DE SUCUMBENCIA RECÍPROCA. RECLAMO
NÃO CONHECIDO. (TJ-SC – AC: 20120187103 Sombrio 2012.018710-3, Relator: Saul Steil, Data de Julgamento: 19/06/2012,
Terceira Câmara de Direito Civil)
TUTELA DE URGÊNCIA. Ação de reparação de danos. Autor que alega ter contraído mútuo do banco réu acreditando tratar-se
empréstimo na modalidade consignada, mas o negócio foi realizado como adesão a contrato de cartão de crédito, e o empréstimo na verdade foi realizado mediante saque no crédito rotativo do cartão. Decisão agravada que deferiu parcialmente o pedido
de antecipação da tutela para suspender a cobrança do débito, e, consequentemente, do desconto do valor mínimo da fatura
no contracheque do autor, bem como para impedir a negativação do seu nome, pena de multa única de R$ 50.000,00. Presente
a verossimilhança nas alegações do autor, pois provado que o crédito foi disponibilizado na modalidade de saque no cartão de
crédito, além de ser fato notório que outras dezenas de clientes do réu contraíram crédito nas mesmas condições e impugnaram
as operações em juízo. Presente o perigo de dano, diante do débito mensal do valor mínimo das faturas do holerite do autor, com
a incidência de encargos exorbitantes de cartão de crédito, gerando o efeito ‘bola de neve’. Decisão mantida no ponto em que
deferiu a antecipação da tutela. Astreintes. Possibilidade de fixação para o caso de descumprimento de obrigação de não fazer.
Arts. 536, § 1º, e 537, caput, do NCPC, e 84, §§ 4º e 5º, do CDC. Decisão reformada tão-somente para reduzir o valor da multa
para montante equivalente ao dobro do empréstimo questionado. Razoabilidade e proporcionalidade. Recurso provido em parte.”
(TJ/SP – 12ª Câmara de Direito Privado – Agravo de Instrumento n° 2187653-58.2016.8.26.0000– Relator o Desembargador
Tasso Duarte de Melo – julgado em 20 de abril de 2.017).
Uma vez reconhecida a inexistência/nulidade da avença, cumpre restabelecer as partes ao estado anterior, o que implica determinar, à autora, a restituição do valor que lhe foi depositado em razão do contrato, corrigidos desde o depósito, e, ao banco,
restituir, à requerente, os valores descontados em holerite ou pagos mediante boleto em razão da contratação, corrigidos a contar
de cada desconto e com juros legais correndo a partir da citação ou de cada desconto, o que tiver ocorrido depois.
Estabelecem-se juros de mora ao banco, por ser da instituição financeira a responsabilidade pela contratação abusiva, aplicando-se, ao autor, o disposto no artigo 396, do CC.
Ressalta-se os descontos no seu beneficio obriga a parte demandante a permanecer no contrato, no qual possui onerosidade
excessiva.
Vejamos o que diz o Código Civil/02:
Art. 478. Nos contratos de execução continuada ou diferida, se a prestação de uma das partes se tornar excessivamente onerosa, com extrema vantagem para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e imprevisíveis, poderá o devedor pedir
a resolução do contrato. Os efeitos da sentença que a decretar retroagirão à data da citação.
Ainda, pelo contrato de Cartão de Crédito com Reserva de Margem Consignável (RMC) é disponibilizado determinado valor ao
contratante, com previsão de pagamento mínimo de fatura pela utilização do crédito contratado, no limite de 5% sobre o valor do
benefício previdenciário.
Tal contratação para operações com cartão de crédito em benefícios previdenciários está prevista no art. 1º da Resolução nº
1.305/2009 do Conselho Nacional de Previdência Social, a saber:
O PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL, no uso da atribuição que lhe confere o inciso V do art.
21 do Regimento Interno, aprovado pela Resolução nº 1.212, de 10 de abril de 2002, torna público que o Plenário, em sua 151ª
Reunião Ordinária, realizada em 10 de março de 2009, resolveu:
Art. 1º Recomendar ao Instituto Nacional do Seguro Social – INSS que, relativamente aos empréstimos consignados, e respeitado o limite de margem consignável de 30% (trinta por cento) do valor do benefício, torne facultativo aos titulares dos benefícios
previdenciários a constituição de Reserva de Margem Consignável – RMC de 10% (dez por cento) do valor mensal do benefício
para ser utilizada exclusivamente para operações realizadas por meio de cartão de crédito.
Ainda, é necessária a expressa autorização do consumidor, por escrito ou por meio eletrônico, consoante art. 3º, III, da Instrução
Normativa do INSS nº 28/2008, alterada pela Instrução Normativa do INSS nº 39/2009, que assim dispõe:
Artigo 3º Os titulares de benefícios de aposentadoria e pensão por morte, pagos pela Previdência Social, poderão autorizar o
desconto no respectivo benefício dos valores referentes ao pagamento de empréstimo pessoal e cartão de crédito concedidos
por instituições financeiras, desde que (...)