TRF3 22/01/2019 - Pág. 323 - Publicações Judiciais I - Tribunal Regional Federal 3ª Região
DECISÃO
Trata-se de ação ordinária ajuizada por IVONE DIAS BENELLI em face da UNIÃO FEDERAL objetivando seja anulada a decisão administrativa prolatada nos
autos do processo administrativo nº 19482.00003/2008-61, afastando-se a penalidade imposta à autora (cassação do registro de despachante aduaneiro).
Alternativamente, requer seja reconhecida a nulidade da decisão proferida, determinando-se à Administração que promova novo julgamento de acordo com as
provas existentes nos autos.
Relata a autora que a pena foi aplicada em razão da utilização de documento falso para a liberação de mercadoria sob investigação aduaneira, fazendo incidir o
disposto no art. 76, III, "d", da Lei 10.833/03. Argumenta, em síntese, que não ordenou a falsificação do documento, tampouco tinha ciência de sua ilicitude,
motivo pelo qual não pode sofrer a penalidade em questão. Sustenta a nulidade da decisão administrativa, porquanto não considerou as provas produzidas
administrativamente, especialmente o depoimento do autor da falsificação. Deu à causa o valor de R$ 10.000,00 (fls. 02/34).
Contestação às fls. 297/302; réplica às fls. 313/315.
Ouvidas as testemunhas arroladas e o Ministério Público Federal.
Foi proferida sentença, com fulcro no art. 487, I, do CPC/15, julgando procedente a ação para "desconstituir o Auto de Infração nº 19482.000003/2008-61, ante
a inexistência de prova incontestável do dolo da autora na utilização do Original 2 duplicado, bem como para revogar a pena de cassação do registro de
despachante aduaneiro da autora". Custas ex lege. Honorários advocatícios fixados no percentual mínimo estabelecido pelo art. 85, § 3º, I, do CPC/15 (fls.
620/624).
Embargos de declaração (fls. 628/632) não conhecidos (fl. 634).
A União Federal apelou. Aduz, em síntese, que a r. sentença contraria as provas contidas nos autos, bem como as conclusões exaradas no processo administrativo
nº 19482.000003/2008-61 e na sentença penal condenatória prolatada nos autos nº 0005928-47.2008.403.6105, no sentido da participação direta da autora nas
práticas fraudulentas que ensejaram a aplicação da penalidade em questão. Afirma ter restado comprovado que a autora foi a mandante da falsificação e,
dolosamente, utilizou o documento para obter a liberação indevida da mercadoria (fls. 649/659).
Contrarrazões às fls. 662/702.
Às fls. 705/706, informa a autora quanto à procedência do recurso de apelação interposto em face da sentença penal condenatória (processo nº 000592847.2008.403.6105), com sua absolvição quantos aos crimes em questão.
Manifestação da União Federal às fls. 713/714.
É o Relatório.
Decido.
A reiteração de decisões num mesmo sentido, proferidas pelas Cortes Superiores, pode ensejar o julgamento monocrático do recurso, já que, a nosso sentir o
legislador, no NCPC, disse menos do que desejava, porquanto - no cenário de apregoado criação de meios de agilizar a Jurisdição - não tinha sentido reduzir a
capacidade dos Tribunais de Apelação de resolver as demandas de conteúdo repetitivo e os recursos claramente improcedentes ou não, por meio de decisões
unipessoais; ainda mais que, tanto agora como antes, essa decisão sujeita-se a recurso que deve necessariamente ser levado perante o órgão fracionário.
No âmbito do STJ rejeita-se a tese acerca da impossibilidade de julgamento monocrático do relator fundado em hipótese jurídica não amparada em súmula, recurso
repetitivo, incidente de resolução de demanda repetitiva ou assunção de competência, louvando-se na existência de entendimento dominante sobre o tema. Até
hoje, aplica-se, lá, a Súmula 586 de sua Corte Especial (DJe 17/03/2016). Confira-se: AgInt no AgRg no AREsp 607.489/BA, Rel. Ministro MARCO BUZZI,
QUARTA TURMA, julgado em 20/03/2018, DJe 26/03/2018 - AgInt nos EDcl no AREsp 876.175/RS, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA,
julgado em 21/06/2018, DJe 29/06/2018 - AgInt no AgInt no REsp 1420787/RS, Rel. Ministro LÁZARO GUIMARÃES (DESEMBARGADOR
CONVOCADO DO TRF 5ª REGIÃO), QUARTA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 26/06/2018 - AgRg no AREsp 451.815/SC, Rel. Ministro JORGE
MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 29/06/2018.
Ademais, cumpre lembrar o pleno cabimento de agravo interno contra o decisum, o que afasta qualquer alegação de violação ao princípio da colegialidade e de
cerceamento de defesa, a despeito da impossibilidade de realização de sustentação oral, já que a matéria pode, desde que suscitada, ser remetida à apreciação da
Turma, onde a parte poderá acompanhar o julgamento colegiado, inclusive valendo-se de prévia distribuição de memoriais (AgRg no AREsp 381.524/CE, Rel.
Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 17/04/2018, DJe 25/04/2018 - AgInt no AREsp 936.062/SP, Rel. Ministra ASSUSETE
MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2018, DJe 27/03/2018 - AgRg no AREsp 109.790/PI, Rel. Ministro ANTONIO SALDANHA
PALHEIRO, SEXTA TURMA, julgado em 06/09/2016, DJe 16/09/2016). Deveras, "Eventual mácula na deliberação unipessoal fica superada, em razão da
apreciação da matéria pelo órgão colegiado na seara do agravo interno " (AgInt no AREsp 999.384/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE,
TERCEIRA TURMA, julgado em 17/08/2017, DJe 30/08/2017 - REsp 1677737/RJ, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA
TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 29/06/2018).
No âmbito do STF tem-se que "A atuação monocrática, com observância das balizas estabelecidas nos arts. 21, § 1°, e 192, caput, do RISTF, não traduz
violação ao Princípio da Colegialidade, especialmente na hipótese em que a decisão reproduz compreensão consolidada da Corte" (HC 144187 AgR, Relator(a):
Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 04/06/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-116 DIVULG 12-06-2018 PUBLIC 13-06-2018). Nesse
sentido: ARE 1089444 AgR, Relator(a): Min. EDSON FACHIN, Segunda Turma, julgado em 25/05/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-111 DIVULG 0506-2018 PUBLIC 06-06-2018.
Na verdade, o ponto crucial da questão é sempre o de assegurar à parte acesso ao colegiado. Por tal razão o STF já validou decisão unipessoal do CNJ, desde
que aberta a via recursal administrativa. Verbis: "Ainda que se aceite como legítima a decisão monocrática do relator que indefere recurso manifestamente incabível,
não se pode aceitar que haja uma perpetuidade de decisões monocráticas que impeça o acesso ao órgão colegiado" (MS 30113 AgR-segundo, Relator(a): Min.
ROBERTO BARROSO, Primeira Turma, julgado em 25/05/2018, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-121 DIVULG 18-06-2018 PUBLIC 19-06-2018).
A possibilidade de maior amplitude do julgamento monocrático - controlado por meio do agravo - está consoante os princípios que se espraiam sobre todo o
cenário processual, tais como o da eficiência (art. 37, CF; art. 8º do NCPC) e da duração razoável do processo (art. 5º, LXXVIII, CF; art. 4º do NCPC).
Quanto ao recurso manifestamente improcedente (referido outrora no art. 557 do CPC/73), é verdade que o CPC/15 não repete essa locução. Porém, justificase que um recurso que, ictu oculi, não reúne a menor condição de alterar o julgado recorrido, possa ser apreciado pelo relator in limine e fulminado. A justificativa
encontra-se nos mesmos princípios já enunciados e também na possibilidade de reversão em sede de agravo interno.
De se destacar, ainda que o próprio art. 8º do CPC atual minudencia que ao aplicar o ordenamento jurídico o Juiz deve observar - dentre outros elementos
valorativos - a razoabilidade. A razoabilidade imbrica-se com a normalidade, uma tendência a respeitar critérios aceitáveis do ponto de vista da vida racional, em
sintonia com o senso normal de pessoas equilibradas e respeitosas das peculiaridades próprias tanto do cenário jurídico quanto da vida prática.
Escapa da razoabilidade dar sequência até o julgamento colegiado a um recurso sem qualquer chance de sucesso, o que se verifica não só diante do contexto dos
autos - que não sofrerá mutação em 2º grau - quanto da desconformidade, seja da pretensão deduzida, seja dos fundamentos utilizados pelo recorrente, com a
normatização jurídica nacional.
Noutro dizer: a razoabilidade impõe que se dê fim, sem maiores formalidades além de assegurar o acesso do recorrente a um meio de contrariar a decisão
unipessoal, a um recurso que é - ictu oculi - inviável.
Há muito tempo o e. STJ já decidiu que, mesmo que fosse vedado o julgamento monocrático, à míngua de expressa autorização legal, "tal regra deve ser mitigada
em casos nos quais falta à ação qualquer dos pressupostos básicos de existência e desenvolvimento válido do processo", porquanto, nesses casos, "despiciendo
exigir do relator que leve a questão ao exame do órgão colegiado do Tribunal, sendo-lhe facultado, em atendimento aos princípios da economia e da celeridade
processuais, extinguir monocraticamente as demandas inteiramente inviáveis" (REsp 753.194/SC, Rel. Ministro José Delgado, 1ª Turma, j. 04/08/2005, DJ
05/12/2005).
DIÁRIO ELETRÔNICO DA JUSTIÇA FEDERAL DA 3ª REGIÃO
Data de Divulgação: 22/01/2019
323/1292