TJBA 07/04/2022 - Pág. 1492 - CADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL - Tribunal de Justiça da Bahia
TJBA - DIÁRIO DA JUSTIÇA ELETRÔNICO - Nº 3.074 - Disponibilização: quinta-feira, 7 de abril de 2022
Cad 4/ Página 1492
Advogado: Joana Pereira Santos (OAB:BA21800)
Reu: Companhia De Eletricidade Do Estado Da Bahia Coelba
Advogado: Luciana Pereira Gomes Browne (OAB:PE786-B)
Sentença:
Vistos etc.
Dispensado o Relatório, conforme artigo 38 da Lei n.º 9.099/95).
PRELIMINARMENTE
ILEGITIMIDADE PASSIVA – No que tange à alegação da ilegitimidade passiva da parte ré entendo que a aferição da responsabilidade desta parte requer análise meritória, o que resta impossibilitado segundo prevê a teoria da asserção. Com efeito, fica rejeitada a
preliminar arguida.
INEPCIA DA INICIAL: Estão atendidos na petição inicial todos os requisitos exigidos por lei. Nesse sentido, foram indicadas as partes,
os fatos, causa de pedir, e os pedidos, bem como foram colacionados os documentos necessários, pelo que fica rechaçada a presente
preliminar.
INCOMPETÊNCIA PELO VALOR DA CAUSA: Suscitou a requerida a incompetência dos Juizados Especiais para apreciar e julgar a
presente lide porque o valor da obra que o caso necessita supera o limite do teto legal da competência. Razão não lhe assiste, haja
vista que o valor da causa deve corresponder ao proveito econômico perseguido no processo e deve ser proporcional à cláusula envolvida na lide e não ao valor da obra necessária para se atingir o bem jurídico pleiteado.
MÉRITO
A parte autora pleiteia a ligação de energia elétrica no seu imóvel, conforme requerimento realizado administrativamente para parte ré,
bem como requer seja indenizado pelos danos morais decorrentes da demora em atender seu pleito em fornecer serviço essencial.
Em peça contestatória a parte Ré aduz que já houve a solicitação da implantação do serviço, através do Programa Luz para Todos,
entretanto, a empresa aguarda a liberação do comitê gestor do governo federal para realizar a execução da obra, vez que este é o
procedimento, inexistindo dano a ser indenizado.
O feito comporta julgamento antecipado, nos exatos termos do especificado no artigo 355, inciso I, do CPC/2015, visto que a questão
controvertida é essencialmente de direito, bastando os documentos carreados aos autos para a formação do juízo de convencimento
deste magistrado, de modo a dispensar a produção de prova oral e/ou pericial na fase de instrução.
Cumpre ressaltar, ainda, que o julgamento antecipado no presente caso não configura cerceamento de defesa, eis que compete ao
Juiz, destinatário da prova, com fundamento na teoria do livre convencimento motivado, valorar e determinar a produção das provas
que entender necessárias ao seu convencimento, indeferindo as que reputar inúteis, nos termos do art. 370, parágrafo único, do CPC.
Tratando-se de relação sob o manto do Código de Defesa do Consumidor, e estando presente a hipossuficiência do autor perante a
empresa ré, não só economicamente, como também tecnicamente, de rigor a inversão do ônus da prova, conforme preconiza o artigo
6º, inciso VIII, do referido codex.
O Programa “Luz para Todos” foi criado com o objetivo de realizar a implementação de energia elétrica à parcela da população do meio
rural que ainda não tivesse acesso a esse serviço público.
A matéria atinente ao programa “Luz para Todos” envolve inequívoca responsabilidade da empresa concessionária em efetivar a implementação de energia, nos termos do Decreto n. 4.873/03, da Lei n.10.438/2002 e da Resolução n.223/03 da ANEEL.
O art. 2º da Resolução 223/03 da ANEEL define concessionária ou permissionária de distribuição de energia elétrica como sendo o
agente titular de concessão ou permissão a que incumbe a prestação do serviço público de distribuição de energia elétrica.
Destarte, resta afastada a suposta ilegitimidade passiva suscitada pela acionada. A propósito, é pacífica a jurisprudência acerca da
responsabilidade da concessionária na instalação de energia elétrica, a saber:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PÚBLICO. OBRA DESTINADA AO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA. PLANO DE
UNIVERSALIZAÇÃO. PROGRAMA LUZ PARA TODOS. RESPONSABILIDADE DA CONCESSIONÁRIA. LEI 10.438/2002. RECURSO AO QUAL SE NEGA SEGUIMENTO. (Agravo de Instrumento Nº 70051196525, Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Carlos Roberto Lofego Canibal, Julgado em 27/03/2013). Grifos nossos.
Imperioso salientar que eventuais obstáculos e entraves para a concretização do Projeto “Luz para Todos”, assumido junto ao Poder
Público, não podem ser transferidos ou suportados ao/pelo consumidor, razão pela qual devem ser suportados pela Concessionária,
através do risco da atividade econômica desempenhada.
É dever da Concessionária, que detém o monopólio da prestação de serviços, ter o controle e ação sobre os locais ainda não abastecidos pelo fornecimento de serviço essencial de energia elétrica, e, desta forma, verifica-se que não se fez comprovação nos autos
sobre providências efetivas por parte da Ré para instalação/execução do serviço.
Em caso semelhante, veja-se o julgado da 4ª Turma Recursal do E. TJBA:
RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. OBRIGAÇÃO DE FAZER CONSISTENTE NA SOLICITAÇÃO DE INSTALAÇÃO DE SERVIÇO DE ENERGIA ELÉTRICA EM PROPRIEDADE LOCALIZADA EM ZONA RURAL, AINDA NÃO ABASTECIDA PELO SERVIÇO. PEDIDO ADMINISTRATIVO FORMULADO JUNTO AO ÓRGÃO. COMUNICAÇÃO ENCAMINHADA NO ANO DE 2006 PELA
ACIONADA INFORMANDO QUE A LOCALIDADE ESTARIA ABRANGIDA NO PROGRAMA LUZ PARA TODOS. PROCESSAMENTO
ADMINISTRATIVO DO PEDIDO SEM QUE O ATENDIMENTO EM DEFINITIVO. ACIONADA QUE CONFESSA O RECEBIMENTO
DO PEDIDO ADMINISTRATIVO DE INSTALAÇÃO DO SERVIÇO, ADUZINDO QUE NECESSITA DE APROVAÇÃO DE COMITÊ
GESTOR, QUE COMPÕE, JUNTAMENTE COM OUTROS ENTES. NÃO COMPROVAÇÃO DAS ALEGAÇÕES DA RÉ, QUE INCLUSIVE CONFESSA ENCAMINHAMENTO DA INSTALAÇÃO DA REDE ELÉTRICA. NÃO COMPROVAÇÃO DA INVIABILIDADE DA
OBRA. CONSUMIDOR PRIVADO DE SERVIÇO ESSENCIAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DA DIGNIDADE DA
PESSOA HUMANA. DANOS MORAIS. FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO DE ACORDO COM OS PRINCÍPIOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE E EM CONSONÂNCIA COM AS PECULIARIDADES DO CASO. SENTENÇA MANTIDA.
RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (Recurso Inominado – Proc.0005515-40.2015.805.0110.Rel. Juíza Ivana Carvalho, Silva
Fernandes. DJ 19/04/2015).
Deveras, o autor permanece sem a prestação de serviço de energia elétrica até o presente momento, fato que não pode prosperar,
considerando que se trata de prestação de serviço de bem essencial, compreendendo o mínimo para a sobrevivência digna e segurança da população, sem a qual há dificuldade no desenvolvimento do ser, seja por falta de armazenamento seguro de alimentos,